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Quando as livrarias morrem…

Por: Eliana Rezende Bethancourt

Recentemente tivemos o fechamento de muitas livrarias não apenas no Brasil mas pelo mundo à fora. Fato que nos causa certa estranheza por seu significado, já que ao ‘morrerem’ levam consigo todo um modo de convívio possibilitado por suas prateleiras e frequentadores. O vazio deixado ultrapassa questões como salões e lojas vazias. O que o corre é uma morte simbólica de muitas formas de vida e de trocas: a intelectual, a cultural, a criativa, a recreativa, a afetiva.
Explico:

Cria de São Paulo, o percurso por livrarias e sebos da cidade faziam parte de meus itinerários propositais: de livrarias pequenas em alguma esquina de alguns bairros à grandes livrarias com acervos imensos havia de tudo. Nos meus tempos da faculdade existiam as livrarias espalhadas pelo Campus que ofereciam temas e autores muito específicos de cada área. Era fácil nos perdermos entre suas prateleiras e folhearmos com voracidade os exemplares que estavam ali para serem manuseados, folheados, apalpados, cheirados e até “degustados”, aumentando ainda mais o desejo de trazê-los para as prateleiras de casa. 

E assim, a cidade tinha para mim como suas referencias as livrarias e os quarteirões em que elas existiam, e as cafeterias que as acompanhavam. Eram circuitos completos de possibilidade e relações, onde a história da cidade e a minha própria história se entrecruzavam e faziam surgir memórias com notas diversas: desde as olfativas às gustativas e emotivas. Alguns trechos especiais ofereciam, cinemas com livrarias e cafés como era o caso do Belas Artes ou dos cinemas da rua Augusta que foram se sucedendo pelos anos até finalmente baixarem suas portas. Pelas ruas que formavam apenas alguns quarteirões tínhamos o melhor de livros de Cultura & Arte, mas não apenas nas livrarias. À noite os vendedores de livros usados montavam suas bancas e vendiam ou trocavam com outros. Eram roteiros perfeitos com caminhos perfeitos, estimulavam paixões, imaginação, introspecção e mergulhos profundos a ideias diversas desenvolvidas em diferentes tempos. Os autores serviam como vozes de inquietação e estímulo, além de companhia perfeita para tardes chuvosas e cantos acolhedores. Às vezes, estes livros nos faziam companhia nos transportes públicos ou momentos de longas esperas. 
Eram fiéis companheiros nas idas às bibliotecas enquanto pesquisas eram desenvolvidas. Mundos e civilizações se descortinavam… sociedades e comportamentos analisados. As livrarias serviam como bunkers que nos serviam de proteção ou ataque ao que quer que fosse. Sentíamos que estávamos abrigados e protegidos com os nossos.

Mas a cidade foi sendo ‘consumida’. Numa autofagia muito própria, diferentes territórios foram desaparecendo dando vez para que cinemas virassem templos, antigas residências que formavam um quarteirão inteiro viravam da noite para o dia estacionamentos. Em outros casos, incorporadoras que conseguem tornar caixas de 15 metros quadrados em ‘loft‘. Palavra chic que significa apenas que você come, dorme e vive num cômodo apertado. O adensamento populacional trouxe gentrificação aos locais e antigos lugares de encontros possibilitados por livrarias ou pequenos livreiros foram sendo simplesmente abduzidos.  

Em verdade, em muitos bairros as livrarias foram simplesmente desaparecendo, deixando para trás a memória dos que ali iam, liam e trocavam experiências, leituras… vidas. 
As portas baixadas, com seus letreiros desatualizados e em vários casos, as pichações indicavam que as livrarias que ali habitavam haviam deixado de existir e que nunca mais retornariam. As fachadas se transformavam em um grande epitáfio simbólico da morte literária ocorrida.

Afinal, o circuito propiciado por livros, leitores e locais que abrigam leitores e ideias, fazem com que haja uma rede de circulação criativa. Se os lugares que abrigam tais livrarias começam a desaparecer uma ‘morte’ metafórica começa a ocorrer. 

Uma livraria, tal como uma biblioteca é um espaço múltiplo e diversificado que oferece em suas prateleiras títulos, sonhos, visões, caminhos… Quando deixam de estar ali presentes deixam todo um espaço de vivência, como se fosse uma grande e irremovível cratera. 
Torna-se um não-lugar, já que até um determinado ponto era referência e lugar.

Mas como poderiam morrer? 

As livrarias não morrem apenas quando baixam suas portas. Morrem todos os dias quando suas prateleiras precisam ser preenchidas com joguinhos eletrônicos, artesanatos, quebra-cabeças e pequenos objetos que servem às lembranças. Quando os marcadores de páginas deixam de existir, pois muito lerão apenas pequenos trechos em suportes digitais. 

As livrarias começaram a morrer, quando os textos pararam de ter o tamanho que seu escritor queria para que suas ideias se expandissem e brincassem com o imaginário de seus leitores. Aos poucos, os livros começaram a ter que ser escritos com poucas palavras e passaram a ser recheados com mais imagens. Os textos, que antes circulavam entre pessoas no formato de livro percorrem agora uma teia digital que usa emogis para indicar a qualidade do escrito. 

E não apenas isso! 

Os formatos digitais oferecem as editoras como a Amazon a possibilidade de saber o número de páginas lidos por um leitor, em quanto tempo, e se foi deixado em algum momento da leitura. A métrica serve de indicador para a editora saber se certo gênero ou autor merecem ou não ser publicados.

E assim, numa relação que era apenas entre leitor e escritor, entra uma figura estranha e algorítmica que determinará a morte literal deste ou daquele escrito e autor. 

Ainda tomando-se em conta este novo mundo livreiro de mensurações algorítmicas, novas perdas se somam: 

O mundo cada vez mais digital, cada vez mais distante e solitário é também mais bruto e literal. Afinal, para que gastar com metáforas que estimulem imaginação?! 

Os escritos seguem rápidos e ágeis para combinar com atenções cada vez mais dispersas. A escrita cada vez mais linear se assemelha ao mundo das animações, onde mais que um roteiro bem escrito, utilizam em sua maioria sons e cores que impactam.  

Mas as livrarias não começaram a morrer com o mundo digital somente. Elas começaram a morrer bem antes, quando os leitores começaram a rarear e quando a sobrevivência de grandes livrarias parecia estar ligada à existência de outros atrativos para além dos livros.  

Em minhas memórias, o maior exemplo que tive foi a Livraria Cultura localizada na Av. Paulista dentro do Conjunto Nacional. Acompanhei todo seu caminho de crescimento e ampliação, sua transformação em uma espécie de shopping onde você podia ouvir CDs antes de os comprar, leituras dramáticas, jogos, e uma quantidade infinita de lembranças eram oferecidas aos visitantes. Quando chegou a este ponto deixou de ser minha livraria do coração para ser convertida em ponto turístico e os que ali estavam não tinham nada que ver com a cidade que havia crescido e vivido. Eram estranhos visitando um lugar, não era a livraria que servia de ponto de encontro de todos que moravam ou trabalhavam na região. Essa mudança foi muito profunda e sentida por mim. Aos poucos, as livrarias especificas de Arte e Tecnologia foram novamente reunidas. Num dia andando desavisadamente encontrei no espaço de livros de Arte um mercadinho de conveniência do Carrefour Express. Senti como que uma facada no peito. A seguir, até o Restaurante e Café Viena baixou as portas. Entendi que era hora de parar pois a minha livraria já não estava mais lá. Havia se convertido em apenas um produto, e que não resultou em todos os seus esforços: faliu! 

Ou seja, o caminho de morte das livrarias físicas é um fato corriqueiro em todas as grandes cidades do mundo contemporâneo. Os livros continuam a ser lidos e consumidos, hoje com muitas possibilidade de suportes, mas os livros apenas nos chegam através dos correios. A vida trouxe-nos a possibilidade da entrega à domicílio e assim seguimos, mas sem nos conectarmos com o circuito que existiria se tantas livrarias não tivessem desaparecido. 

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Uma sociedade de performance

Por: Eliana Rezende Bethancourt

Segundo diferentes teóricos a sociedade de princípios do século XXI deixou de ser disciplinar, como ocorria nos séculos XIX e XX e passou a ser de performance. O que significa dizer que exige-se das pessoas estar todo o tempo hiperconectadas, ser multitarefas, e estar em um estado permanente de euforia e felicidade. Substitui-se a chamada obediência pelo desempenho.
O sujeito neoliberal do desempenho é dominado pelo excesso de positividade (estímulos) em oposição à chamada negatividade.

Tudo que esteja fora disso é considerado indesejável, contraproducente.

As pessoas precisam, para serem consideradas bons profissionais, ser multitarefas. Ainda que isso signifique um grau de desatenção atroz. As pessoas quicam de um lado para o outro achando que com isso possam ter, segundo linguagem corporativa, um diferencial competitivo.

O mundo encheu-se de academias de ginástica, baias de trabalho, prédios envidraçados, vias rápidas, equipamentos eletrônicos, eletrodomésticos computadorizados. Temos cada vez mais tecnologia, em teoria, para que tenhamos mais tempo. Mas, mais tempo para quê?

O que fazemos cada vez mais com o tempo que nos é ‘pretensamente economizado’?

O tempo encurta e, em verdade, as pessoas estão sempre cansadas, carregadas de afazeres e atividades. Onde foi que colocamos nossas prioridades?!

Estranhamente ao invés de, tanta hiperatividade e desempenho gerar coisas novas, encontramos em geral, a repetição incessante do igual. Cada vez mais temos mais do mesmo!

Até mesmo os vocabulários corporativos giram em torno das palavras de sempre: motivação, resiliência, eficiência, competitividade, iniciativa, diferencial, sair de zonas de conforto, etc…etc…etc…uma quantidade sem fim de termos usados à exaustão pelos chamados “mentores”, “coaches” e os que se autodenominam como “iniciadores” deste caminho de sucesso individual. Surge um mercado ávido e muitas vezes, baseados na má fé de uns sobre a boa de fé de outros.

Em verdade, a desatenção, hiperatividade e hiperconexão servem de sombra para ampliar horizontes e descobertas que só podem ser alcançadas a partir do sossego da mente e a capacidade de observação e quietude do espírito. Daí que o que acaba contando são comportamentos que podem ser cifrados e contabilizados por dígitos. Valores essenciais deixam de ser cultivados e apreciados tanto individualmente quanto institucionalmente.
É só olhar no mundo corporativo: as cifras, as metas, os índices, os infográficos e os KPIs. Olhe nas academias, nos esportes, nas escolas, nos veículos perfilados lado a lado quando um farol se abre, nas filas em geral. Em todos os casos, se busca a prioridade, ser o primeiro, o mais rápido, o melhor.

De seres humanos temos paulatinamente nos transformado em “máquinas de desempenho” que estão todo o tempo medindo e sendo medidos a partir das cifras que conseguimos produzir.

Afinal, quem tem tempo para a observação? Para simplesmente aquietar-se? Ouvir-se? Ouvir?

Não bastasse tudo, o inicio do século XXI também nos trouxe o Home Office em meio a uma Pandemia! De repente, aquilo que já nos consumia e atormentava encontrou meios de piorar um pouco mais.
A casa e ambientes residenciais tiveram que se adaptar as rotinas de trabalho, e em muitos casos o sentido de adaptação veio em seu pleno sentido! Reuniões online e atividades domesticas sofrendo enquadramentos diversos e seus proprietários buscando formas de encontrar um meio de equilibrar tudo. Não faltaram os que começaram a considerar que na receita toda estava faltando espaço e boa dose de saúde mental.

Somado à tudo, as tecnologias que poderiam ser as libertadoras de tempo e espaço em nossas vidas tornaram-se durante todo o período pandêmico ferramentas potentes de controle e expropriação. Reuniões sequenciais, muitas vezes mais que uma em um mesmo horário. Por meio de plataformas digitais, diferentes profissionais, conheceram o que seja o “não-lugar” e levaram à máxima de otimização do tempo às ultimas consequências.
Zoom, Meet, e congêneres passaram a oferecer facilidade, mas sua fatura incluía a disponibilidade ampla, total e irrestrita. Manter-se conectado, atento e muitas vezes, bem humorados passou a ser a regra geral. O teletrabalho ofereceu o confronto com os “outros” e consigo próprio no espelho. Dia após dia olhar nossa face ao mesmo tempo em nossos pensamentos povoam nossas mentes passou a ser uma regra. Questões de autoimagem passaram a ser permanentes, intimidades passaram muitas vezes a ser desvendadas, espaços invadidos. As fronteiras antes físicas que demarcavam espaços de vivências e intimidades se perderam entre uma porta e outra e, de repente, o mundo entra com todas as suas cores, imagens e vozes para dentro de nossa casa.
A vista e o confronto com a própria imagem diariamente por horas a fio elevou as taxas de cirurgias de pequena correção: são pequenas rugas, bolsa nos olhos, botox, nariz, um contorno de lábios, manchas na pele, quedas de cabelo. O confronto externo leva a grandes embates e combates com camadas profundas de nosso ego. Descobrimos muitas vezes que a imagem no espelho não nos agrada. E isso gera um profundo, um grande cansaço…

Espaços comuns para pessoas que detinham apenas parte de nossa intimidade são retirados de nós, e as sociabilidades passam a sofrer mediações totalmente inusitadas até aquele momento. Eliminam-se rituais de convivência: um almoço, um café descontraído, uma caminhada com colegas. Tudo é subtraído de todos, seus locais de trabalho, salas, computadores, mesas, apertos de mão, abraços, sorrisos largos.
A busca de performance ainda presente exigia atenção, conexão, disciplina (sem demonstrar atrasos ou aparentar fadiga, desinteresse, etc). As janelas invisíveis nos colocavam nus, e ali tínhamos de permanecer até que nos fossem dadas a fala ou a autorização de saída.
O ambiente digital trazia inúmeros desafios e uma nova etiqueta social, que por vezes gerava ansiedade, desconforto, insegurança. Mas tais sentimentos não eram bem vindos nestes ambientes. Assim, buscar a melhor performance era imprescindível.

Mas ainda havia o espaço físico.

A convivência por tempos maiores com os membros imediatos das famílias trouxeram à tona problemas até então suplantados por agendas lotadas com compromissos de trabalho ou sempre com muita gente em volta. As agendas lotadas contemplavam todos: de pais aos filhos. Até as crianças possuíam em famílias mais abastadas e que foram em sua maioria contempladas com o Home Office tinham a agenda de escolas, cursos de inglês, balé, judô, natação. Não havia espaços de solicitação, pois todas as brechas de tempo eram ocupadas e os pais apenas administravam os intervalos, levando-os ao fim do dia para dormir. A pandemia e o estar em casa todos juntos e misturados trouxe para uma grande maioria um estresse imenso.
Em verdade, as pessoas lidavam pouco com o que lhes causava ansiedade ou tristeza porque não paravam para falar ou pensar sobre elas. Mas a partir do momento que o único local possível era estar em casa e próximo aos seus problemas mais secretos muitos começaram a se deprimir, com amplas dificuldades de lidar com tudo que vinha de dentro e do lado de fora o medo, o desemprego, políticas de governo insanas, mortes.
Para muitos foi simplesmente demais.

Cada vez mais e como imperativo de alta performance corpos cansados e sem ritmo são estimulados por diferentes fármacos: doping de todas as formas. Sempre foi assim: mentes entorpecidas e distantes para problemas próximos.
A indústria farmacológica sempre apostou nos mais diferentes fármacos: há para cansaço, sono, tristeza, ansiedade, inapetência. Mas com a Pandemia esta indústria aumentou ainda mais seus tentáculos e possibilidades para lutar contra algo que ainda não tinha uma clara definição. Desde sempre é papel desta indústria farmacêutica produzir de tudo para que tais corpos tenham a garantia de sua manutenção na linha produtiva e performática.
A adequação da indústria farmacêutica às demandas de performance pode ser facilmente medida pelo seu volume de produção. Tomemos como exemplo o ano do inicio da pandemia no Brasil:
O faturamento do mercado farmacêutico cresceu 13,6% de janeiro a outubro de 2020. Nesse período, o volume movimentado por esse mercado foi de R$ 113,02 bilhões, segundo dados da IQVIA, que auditora o setor farmacêutico. As vendas de suplementos, vitaminas, relaxantes e antidepressivos tiveram destaque nos primeiros dez meses do ano – e estão diretamente relacionadas ao momento vivido pela população por causa da pandemia de Covid-19.

Reproduzindo o filósofo coreano Byung-Chul Han, um dos representantes desta linha de pensamento, no seu ensaio “A Sociedade do Cansaço”:

“(…)”O cansaço da sociedade do desempenho é um cansaço a sós, que isola e divide”, conclui o autor. “Esses cansaços são violência, porque destroem toda comunidade, toda proximidade, inclusive até a própria linguagem.”(…)

O interessante e segundo o autor, somos escravizados mas não por outros. É uma demanda interna que enxergamos como sendo necessária para a nossa atuação. É uma escravidão onde temos a chave. Em suas palavras: somos prisioneiros e vigiais.
Este sentido de exploração que obedece uma demanda interna é muito eficiente já que produz a falsa sensação de “liberdade”, de “escolha” e se casa muito bem com uma concepção do que seja o neoliberalismo na vida das pessoas e o chamado espírito “empreendedor”.
Se casa muito bem também com a concepção muitas vezes equivocada de que são seus erros que causam seus fracassos, quando nem a sempre a culpa pode ser toda atribuída a si próprio. Mas é a melhor resposta a se dar ao carcereiro de sua alma.

Em resumo:

Embriaguez química e digital: excitação e atordoamento de toda uma civilização.

A incapacidade de se lidar com a dor, o sofrimento, a angústia são afastadas à todo custo, quer por drogas vendidas em farmácias, quer pelas drogas das indústrias de bebidas. O alívio é buscado como forma tanto de manter-se em todas as tarefas, ou como forma de entorpecer os sentidos e simplesmente lidar com a demandas da existência.

Para onde vamos se respostas humanas não podem mais ser dadas, sem ser tomadas como uma patologia que precisa ser imediatamente medicada?

O sentido de urgência e pressa chega também com a forma como se lida com as emoções e as muletas buscadas são de todas às ordens. A oferta é grande e pode ser de remédios à drogas, ou ao mercado da fé. Aos que não se encaixam nestas fugas possíveis há o Burnout (nome da Síndrome do Esgotamento Profissional – um distúrbio emocional que possui como sintomas principais a exaustão, o estresse e profundo esgotamento físico).

É preciso compreender que a sociedade de performance transforma a todos que não se dão conta disso em peças de engrenagem. O seu uso extenuante apenas levará a sua reposição, e na atual conjuntura há muitas esperando sua vez de ser sucateada.
É preciso ter crítica e fazer perguntas a si próprio sobre a forma como conduz sua vida e seu trabalho.

Afinal, para onde vai com tanta pressa e tão cansado?

________________
* Versão revisada e atualizada de post publicado originalmente no meu Blog, o Pensados a Tinta

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Bibliografia:
HAN, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Giachini, Enio Paulo. 2. 2017. Vozes, Petrópolis: 128

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Escrita: palavra vincada

Por: ElianaRezendeBethancourt

Houve tempos em que a gaveta era o melhor amigo de um escritor. Era ali que o texto adormecido esperava seu tempo de maturação, ou até seu tempo de descarte: do não dito e escrito. As palavras assim esperavam adormecidas e quietas, o tempo em que a tinta as materializasse e lhes propiciasse vir à existência.

O texto adormecido na gaveta esperava sua sentença que podia vir cedo. Num acesso de fúria e destruição ou num período de limbo expiatório. O melhor mesmo era quando recebia sua emancipação e tornava-se um texto livre à olhos alheios.

Sim, os textos nos tempos de imediaticidade e consumo deixaram de ter essa maturação da escrita pensada e recomposta dia a dia. Literalmente lapidada para, palavra por palavra, compor um pensamento inteiro.

O sentido de escrita original gradativamente se perdeu e o que temos é uma que se insere substituindo e anulando a anterior.

Descartes simples e rápidos que não nos dão o sentido de sua plenitude. Oferecem-nos apenas e tão somente o produto do dia, do agora. Uma escrita quase que sem passado, sem rastros ou vestígios. Novos tempos de leitores e de escritas. Não apenas de seus suportes e formas de veiculação.

A gaveta oferecia  o tempo da intimidade. Algo que se cristaliza e pigmenta. A tinta encontrava o papel e se fazia pensamento materializado. Era ideia que se expunha.

A escrita, tanto como a leitura, são coisas que se cultivam e aprofundam com o tempo. Algo que tece nossas impressões sobre o mundo. Merecem ser pensadas com cuidado, lapidadas com tempo e apreço pela palavra que se diz e por quem a lerá. O tempo de escrita rápida e imediata em busca de respostas sempre prontas e rápidas tiram os textos dessa quietude que às vezes, é tão salutar. Ao mesmo tempo, e isso por experiência própria, um texto é sempre novo a cada vez que o retocamos. O rigor da gaveta pode inviabilizar um escrito.

Às vezes o ideal é simplesmente deixar a escrita solta e entregá-la à independência para que novas ideias surjam. Nem maiores e nem melhores, apenas oxigenadas pelo novo! A escrita tem mesmo esse quê de artesanato, de cuidado lapidar. Considero normal que um texto nunca esteja concluído, o que ocorre é darmos a eles a independência de nossa tutela.
É a emancipação do escrito.

Nos dois casos é interessante: se reescrita constantemente ou se amadurecida para um momento específico.
É palavra vincada.

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* 1º Post publicado no meu Blog, o Pensados a Tinta, e agora aqui no Portal em homenagem ao Dia Nacional do Escritor, comemorado em 25/07.

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De Leitores e Leituras

Por: Eliana Rezende Bethancourt

De novo sobre leitores e leituras. Instigando todos a pensar um pouco…

Em “Utopia de um homem que está cansado“, Borges descreve o encontro do narrador com um homem de quatro séculos, que vive no futuro – ‘um homem vestido de cinza’, cor que envolve os mensageiros da estranheza em vários contos do escritor argentino – e que faz assustadoras revelações. Uma delas é a extinção da imprensa, “um dos piores males do homem, já que tendia multiplicar até a vertigem textos desnecessários”. (BORGES)

À revelação do desaparecimento da imprensa no mundo do futuro, o narrador responde com um longo discurso:

“Em meu curioso ontem (…) prevalecia a superstição que entre cada tarde e cada manhã acontecem fatos que é uma vergonha ignorar. O planeta estava povoado de espectros coletivos, o Canadá, o Brasil, o Congo Suíço e o Mercado Comum. Quase ninguém sabia a história anterior desses entes platônicos, mas sim os mais ínfimos pormenores do último congresso de pedagogos, a iminente ruptura de relações e as mensagens que os presidentes mandavam, elaboradas pelo secretário do secretário com a prudente imprecisão de que era própria do gênero.
Tudo se lia para o esquecimento, porque em poucas horas o apagariam outras trivialidades. (…)
As imagens e a letra impressa eram mais reais do que as coisas. Só o publicado era verdadeiro”
. (BORGES)

A verdade é que neste tempo distante e assustador de Borges extinguiram-se não apenas os jornais, mas também os museus e as bibliotecas. Inexistiam monumentos, feriados ou espaços de rememoração; inexistiam cidades. Dito de outra forma: todos os espaços destinados a cultura, convivência e memória foram extintos, restando apenas uma grande ode ao esquecimento, nada era feito para lembrar ou fazer recordar.

Tal como ocorre aqui no texto de Borges, a leitura parece ser feita sob muitas circunstâncias, para o esquecimento.
Gostaria de levá-los a repensar a literatura e suas relações com seus leitores e o contexto de produção de suas obras.

Isso porque a leitura sempre vai além do texto. É preciso tomar em conta o leitor, o escritor, o texto, a época em que o texto é produzido, bem como o tempo em que o mesmo é lido. Cada texto assim pode ser sempre recriado, reinventado a cada vez que é reinterpretado e/ou assimilado.
Mas vejo que cada vez mais essa forma de ler parece ser algo bem além do que nossa civilização seja capaz de fazer. Distraídos, dispersos e na maioria das vezes ávidos apenas pelo novo que chega, deixa essa possibilidade de leitura para trás.

Para este caso, a leitura tal como a conhecíamos no mundo analógico, talvez esteja encontrando o seu final. O déficit de atenção e a indisposição pela verticalização inviabilizam este tipo de leitura. Refiro-me àquela leitura quase que feita como degustação. Pausada em cada trecho, parágrafo ou ideia para melhor assimilá-la. Flutuar com os pensamentos por entre as linhas e pelos não ditos. Divagar por entre trechos, sensações ou mesmo silabas. Encontrar as brechas que rementem a outros encontros e pensamentos.
Percorrer uma obra é como visitar uma cidadela muralhada e oferece diferentes roteiros e percursos. Oferece experiências diversas para cada um que se aventura sobre ela. O bom escritor consegue caminhar com muitos tipos de leitores. E assim a mágica entre obra, leitores e leituras se dá.

Com as leituras feitas em tempos de textos hiperlinkados ou com um deficit de atenção e interesse abaixo dos razoáveis, aqueles que se dedicam à escrita terão que possuir uma sensibilidade ainda maior. Se pretendem alcançar seus leitores, deverão estar atentos ao modos que estes leem.

E assim, a literatura (seja ela de ficção ou não-ficção) e provavelmente, seus autores terão que tomar esse dado para além dos suportes e grau de interação possível e provável. O leitor sempre em fuga torna-se um “ser que quica”: pula de um lugar ao outro, com mentes dispersas, dedos ávidos e concentração ligada num modo mínimo.
E-books, por exemplo já conseguem determinar o tempo de concentração por página, velocidade de leitura por página e obra, o que ajuda a determinar o quanto um leitor de fato se detém sobre o que lê. Agora determinar o grau de proveito dos mesmos continua uma incógnita. O escritor nunca saberá se suas tintas de fato alcançaram seus leitores ou se simplesmente plainaram sem interagir de fato com o escrito.
Tempos novos, interessantes e de muitos desafios.

Crédito: Orelha do Livro

Felizmente acho que muito poucos ainda põem em questão o término do livro.
Há algo aqui que envolve a qualidade de leitores. O bom leitor é arguto, perspicaz e caminha com o escritor. Busca todo o tempo interlocução de ideias e conteúdo. E talvez aqui exista a maior fragilidade a ser vencida. O verdadeiro leitor é antes de tudo um ser crítico. Não no sentido pejorativo de gostar ou não das coisas, mas no sentido de saber ser interlocutor fazendo as perguntas adequadas ao lido e as transpondo para seu universo de atuação. É assim que se constrói repertório: ler; questionar; reformular e aplicar. Empoderar-se do lido e transformá-lo em seu.

Com os tempos de superficialidade de leituras temos cada vez mais pessoas apenas reproduzindo o lido, e é neste sentido que quero instigar os leitores a irem além do escrito e propor novos caminhos para antigos questionamentos. É fundamental que os que desejam ser verdadeiros leitores aprendam a de fato interagir com o autor: dialogar por meio de uma leitura eficaz.
Em outro artigo procurei mostrar como “Ler de forma produtiva“. Nele aponto diferentes formas de transformar sua leitura em algo verdadeiramente proveitoso.
Experimente!

Procurando ser bastante objetiva, nossos tempos oferecem uma complexidade e diversidade sobre o perfil de leitores e leituras.
Entenda:

Conseguimos ter vários tipos de leitores, talvez o primeiro deles seria os leitores analógicos: aqueles mais contemplativos de leituras lentas e longas, nascidos e crescidos num tempo de leituras e produção textual totalmente analógica. Este tipo de leitor se relaciona com a leitura de uma forma totalmente diferente dos chamados nato-digitais. Em geral, preferem publicações em formato físico e tem nos livros objetos pessoais de companhia e vida. Transitam com eles enquanto os lê e destinam locais especiais para que sejam armazenados, lidos, contemplados ou apenas vistos. Seus livros ganham espaços em bibliotecas, mesas de centros e escrivaninhas onde surgem não apenas como objeto para leitura, mas também são usados decoração, ou mesmo como forma de ostentação de status quo ou erudição. Em muitos casos são de fato, manipulados e usados como referência. Tê-los em mãos oferecem aos seus leitores uma experiência tátil que chega pela capa e tipos de encadernação, formato, gramatura de papel e qualidade do papel, dos tipos de letras impressas e das ilustrações usadas. Possuem um odor próprio: onde celulose e tintas se misturam e trazem um odor que lhe são próprios. Oferecem aos seus possuidores o prazer das sensações.

A seguir temos um outro tipo de leitor e que prefiro chamá-los leitores híbridos: não são nato-digitais, mas são intermediários entre os tempos analógicos e os digitais. Conseguiram assimilar as duas maneiras de produzir e ler textos, e de acordo com seu interesse vão de um à outro sem grandes dificuldades. De certa forma ainda interagem com os textos digitais da mesma forma que interagem com os textos analógicos, ou seja, leem de forma mais linear e atenta, alguns chegam a optar por concluir uma leitura para seguir por outra e assim sucessivamente. Ainda apreciam os livros em formato analógico, mas em vários casos optam pela praticidade de um e-book e começam a investir em bibliotecas mais digitais pela suposta economia de espaços e acessos. Será possível que este leitor híbrido tenha seus aparelhos digitais preferidos para leitura tanto quanto o leitor analógico tem seus livros preferidos.

Mas há o leitor que é ubíquo (aqui usando uma expressão de Santaella, 2013) na sua forma de ser: interage com suas leituras ao mesmo tempo que interage com o ambiente e com outros aparelhos. Usa fartamente possibilidades não lineares de leitura e segue indo de um lugar ao outro. Clica e pula por várias telas, meios, textos, imagens, sons. Concentra-se em ter os aparelhos mais recentes e provavelmente terão várias abas e aparelhos abertos em temas diversos. Em muitos casos, interagem ao mesmo tempo com o ambiente em que estão inseridos e os veremos conduzindo e ouvindo um podcast ou audio-livro, ou estarão usando mais do que um aparelho para funções diversas, incluindo-se até o uso de mensagens e telefonemas.
Para este perfil os textos não podem ser longos demais sob o risco e pena de serem abandonados sem muitas cerimônias.
A velocidade de rolagem das telas digitais fará quem em geral leiam apenas os primeiro parágrafos e rapidamente se dirijam para as linhas finais. Não aguarde deste tipo de leitor uma fidelidade canina ou fixação em cada palavra ou pensamento desenvolvido.

Se de um lado temos a possibilidade de ter um número maior de alfabetizados como em nenhum outro momento da história, por outro lado estes encontram-se dispersos e desatentos. A leitura deixou de ser algo restrito a muito poucos, mas a contrapartida é ter leitores mais dispersos e desatentos.

O que fica de fato é que cada vez mais teremos tipos de leituras para leitores diversos, e caberá aos que escrevem ter sempre isso em mente para conseguir encontrar-se com seus leitores.

Referências:
BORGES, Jorge Luis. “Utopia de um homem que está cansado
Danziger, Leila – O Jornal e o Esquecimento
Orelha de Livro
MARTINS, Vagner Basqueroto. “E-books em tablets: um estudo sobre a opinião de leitores adultos acerca de sua experiência de uso”. Curitiba, 2016 – Dissertação de Mestrado em Design, UFPR
SANTAELLA, L. Repercussões na Cultura e na Educação. São Paulo: Editora Paulus, 2013.

* Post atualizado de publicação feita originalmente no meu Blog, o Pensados a Tinta

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A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação dos direitos autorais (Lei nº 9.610/1998).

Vamos parar de educar para a mediocrização!

Escrito e lido por: Eliana Rezende Bethancourt
Ouça eu ler para você (escolha a opção abrir com: 
Music Player for Google Drive)

Uma análise sobre os sistemas educacionais hoje vigentes, não apenas no Brasil mas no mundo, revela uma condição decepcionante.
Apesar de tantos desenvolvimentos tecnológicos a realidade Educacional e os ambientes ditos de escolaridade estão longe de formar seres pensantes, atuantes e com espírito crítico e interventor.
Não há inteligência social nos modelos que temos.

O sistema educacional, até por sua conformação física, revela uma dicotomia entre o mundo vivido e o compartilhado em realidade 4.0 para uma vivência “fabril”. As escolas mantém seus espaços tal como projetados como os modelos pós industriais diziam que deveriam ser linhas de produção. Num ambiente onde todos são tratados como engrenagens e de forma homogênea fica difícil, não somente reconhecer mas valorizar potencialidades.
A norma assim é mediocrizante. Pensa-se na educação que sirva a todos… na média!

A lógica é muito simples: entra-se na escola com a mesma idade e aos lotes, todos são agrupados formando turmas e séries. A premiação bimestre a bimestre é atingir as notas, definidas de forma generalizante e que sempre estipulam uma nota mínima considerada média. E isso em geral, é conseguido por um desempenho que premia memorização, pura e simples, em alguns casos, a cola aparece como um recurso ainda pior e mais medíocre. Os que responderem de forma mais eficiente a todo o processo repetitivo e mediocrizante serão considerados aptos a seguir para a série seguinte. Estão promovidos. Até que um dia ganham um diploma. E com este pedaço de papel nossos alunos medíocres em série seguem para um mercado de trabalho.
E que, pasmem, querem criatividade, espírito crítico, colaborativo e independente!

Estranhamente, conteúdos são ensinados segmentadamente, como se nada tivesse relação com nada. Embala-se conteúdos em série e estes são descarregados série a série pelo primeiro desavisado de plantão que resolver assumir os mesmos. Os tantos especialistas em suas respectivas áreas não fazem a menor ideia como sua disciplina conversa com a outra, ou como se relaciona com a vida vivida extramuros ou a que se compartilha em rede. E assim, todos seguem usando materiais prontos e cumprem cronogramas, ementas, avaliações. Imaginam que ao conseguir as tais notas de média terão ajudado a constituir um educando e formado minimamente um cidadão social. Usam-nas como régua para medir supostos avanços ou cumprimento de metas, objetivos e afins.

Perde-se tempo enorme ensinando sobre a escravidão no Brasil, por exemplo, e em nenhum momento se discute sobre xenofobia, preconceitos, modelos produtivos e afins. Sempre há aquele limite chamado de politicamente correto e assuntos tabus para uma escola.
Mas não estamos falando em formação? Exercício de cidadania? Papel na sociedade? Não entram nesta discussão o papel biológico que torna os seres diferentes por fora, mas biologicamente semelhantes em sua essência?! Não seria uma conversa para todas as disciplinas?

Ensina-se sobre a antiguidade grega e romana, mas não se fala sobre o papel da democracia e como nos tornar cidadãos conscientes, hoje. Como foi a construção da ideia de cidadania, moral, gênero a partir destas civilizações? Como a geografia, a filosofia, a biologia, o pensamento racional via áreas exatas construíam a ideia de cidadão? E como este cidadão se relaciona hoje com tais temas? O que o mundo contemporâneo fez com tais assuntos? Isso tudo fica fora dos conteúdos.
E me pergunto: então para quê o sistema de ensino?

Tentam ensinar sobre países estrangeiros, suas capitais, economias. Mas será que os alunos que chegam de carro e vão embora de carro conhecem o seu bairro? Sabem o que é uma periferia? Fazem ideia de como vivem pessoas sem rede de esgoto? Que projetos seriam capazes de realizar para limpar e filtrar água, captar água de chuva ou aquecer água usando placas solares feitas com materiais alternativos? Sabem construir uma?
E a pergunta principal: os professores de geografia, ciências, física, química, biologia… sabem?

Ensinam-se sobre invenções, mas como discutir o papel das mesmas em nossas vidas, suas aplicações e caminhos? Qual a diferença entre invenção e inovação? Todas as áreas de saber estariam ali envolvidas.  E fico perplexa de ver como ninguém relaciona nada com nada.

Será que um aluno sabe como funciona um rádio? Uma TV?  Já desmontou um ou outro? Sabe quais são seus componentes? De que forma o som e a imagem se propagam? Como a música toca? Como nossa audição e visão funcionam?  Enxergamos com os olhos ou com o cérebro? E os animais escutam e veem da forma como escutamos e vemos? E uma máquina fotográfica? Como eram as primeiras? Como funciona uma caixa preta? Como a imagem se forma? Como se processava a revelação de um filme? Como é hoje uma imagem digital? O que significa do ponto de vista da representação um retrato? Como a arte representava as pessoas? Como nos fazemos representar? Onde todas estas imagens produzidas diariamente são armazenadas? O que é a nuvem? Como nossos arquivos pessoais são armazenados?  Por quanto tempo? Por quem e para quê? E quando não estivermos mais vivos, como ficarão nossas contas na internet?

E de novo pergunto: os professores de todas estas disciplinas correlatas e afins sabem fazer? Se interessaram algum dia em fazer as perguntas e ir atrás de respostas?

Notem que o que movimenta tudo não são conteúdos prontos: são as perguntas que geram a ação e a consequente produção de conhecimento. O professor não tem que saber, o aluno não tem que saber. Mas todos podem estar envolvidos na busca. E na retroalimentação de mais perguntas para ir mais longe e além. 

Vejam quantas possibilidades interdisciplinares há e que são perdidas diariamente. 

Será que isso para ser ensinado precisaria ser feito em divisões de turmas e idades? Não seria muito mais criativo, interessante e divertido que os alunos escolhessem o que queriam aprender e como? Independente de idades e turmas?
Não seria muito mais interessante que os professores funcionassem como mentores nestas descobertas, criassem projetos e os desenvolvessem ao longo de um período? E aí sim teriam resultados muito mais gratificantes, instigantes e interessantes?
Por exemplo: como criar uma rádio comunitária, elaborar as programações, produzir conteúdos, inventar produtos para serem comercializados, criar noticias. Ou seja, um único projeto pode fazer com que todas as disciplinas estejam envolvidas!  

Lembro-me de uma vez quando ministrava aulas, para as antigas 7ª e 8ª séries, numa escola tradicional carmelita. Não suportava a ideia de ter que cumprir aulas que vinham encaixadas em sistema pedagógico, no formato Anglo. E então resolvi que para falar dos anos JK e posterior (1950-1970) iria fazer um trabalho que envolvesse todas as turmas. Iríamos reconstituir o que ocorria no Brasil e no mundo na época. Os alunos se reuniram por interesses: uns foram para a arquitetura, outros engenharia, outros foram para a moda, outros o período dos festivais de rock como Woodstock e vários outros ficaram com MPB. Houveram os que construiram maquetes, outros criaram um desfile de moda e ainda outros tiraram letras de música para tocar ao vivo. Haviam os que eram tímidos demais, mas ajudavam nos bastidores: faziam as músicas passarem de forma correta no desfile, cuidavam da iluminação (eram donos da logística para o evento).

Passamos o semestre todo preparando o evento e na última semana de aula a apresentação no auditório reuniu a escola inteira, professores, pais e tivemos teatro, dança, show de rock com bateria e guitarra ao vivo tocado pelos alunos. Desfiles e uma exposição de maquetes pelos corredores. Frequentávamos o laboratório de informática e usávamos a internet para várias pesquisas e inspirações. Aqui, um à parte interessante: o laboratório era muito equipado e tínhamos um computador por aluno, e isto em 2005. E APENAS EU usava para minhas aulas! O resto do tempo o laboratório era apenas para fazerem alguns trabalhos ou jogar em horas vagas. Nenhum outro professor usava.

Os pais no período anterior à apresentação me cercavam nas reuniões preocupados, perguntando que, como aquilo seria ensinar. Me perguntavam: “E o conteúdo?!” Minha coordenadora ficava preocupada com o exame que teriam que fazer para continuar tendo o sistema de ensino validado.
Eu penas sorria…

O resultado?
Nunca a nota geral do sistema foi tão alta! Os alunos me diziam: “Prôf., eu lembrava de tudo o que estávamos fazendo… sabia tudo!”. Isso tudo para dizer, que não era fácil, lidava com meus colegas de trabalho torcendo o nariz: os alunos começavam a ficar excitados antes de minha aula, e era normal ficarem após as aulas discutindo o projeto uns com os outros. Nunca ficava em sala de aula com eles. Andava pela escola toda vendo locações, debatendo. E com os alunos espalhados por toda parte. Tivemos aula até embaixo de um pé de amora em dias quentes. 
Mas foi extremamente gratificante, e me mostrou que é muito possível.
Sei que tanto eu quantos eles sobrevivemos e aprendemos muito!

Lembro-me de ir ao cinema com todos numa matinê assistir o filme “Cruzada”, e como éramos praticamente nós, eles se levantavam durante o filme e me perguntavam coisas e eu falava. Era uma troca intensa e muito rica. Foram ao filme com tudo lido e depois queriam falar sobre o assistido.
Uma experiência agradabilíssima!

Turmas de 7ª e 8ª Séries do ano de 2005 – Colégio Nossa Senhora do Carmo – SP – com trajes dos anos1960

Em muitos casos os próprios alunos não querem essa mudança de paradigmas. Se ressentem destas ousadias.
Ministrando aulas na faculdade costumava (e porque era obrigada a) dar provas, mas estas eram com consulta e em duplas. E não existia para mim certo ou errado. Dizia que queria que desenvolvessem um raciocínio e me convencessem. Mesmo errado o que valeria seria a construção.
Como era difícil para alguns!
Me diziam que minhas provas eram as piores. Mas exatamente porque nunca cobrei algo decorado e pronto. E aí está o limite imposto por um sistema no qual tinham sido formados; uma linha de montagem. Não eram/são capazes de pensar por si sós!
Tão triste!

Por isso, meu clamor: vamos parar de educar para a mediocrização! É muito mais rico e muito mais satisfatório para todos.
Experimentem!

ADENDO PÓS-PANDÊMICO:

O artigo acima foi publicado em Agosto de 2015, e já naquele momento eu externava uma realidade vivida como experiência 10 ANOS ANTES. Ou seja, há 15 anos já pensava e aplicava ideias que hoje em dia (2020), seriam chamadas de “sala de aula invertida”, “metodologias ativas” e o ensino via Projetos em voga nas chamadas “Escolas Inovadoras”.

Meu desconforto entre a cisão entre conteúdos ensinados em sala e o mundo aqui fora era grande. Mas hoje em dia sinto ainda pior.

A pandemia descortinou um mundo de despreparo generalizado não apenas de escolas e suportes possíveis para o ensino feito à distância. Revelou um total inabilidade de muitos professores em lidar com uma escola sem paredes e cadeiras perfiladas. Subtraídos deste lugar de segurança onde conteúdos desfilam monotonamente, alunos e professores simplesmente não conseguiam encontrar um caminho para ensino/aprendizagem. Em verdade, o erro de séculos foi o de NUNCA ensinar os alunos a APRENDER. E aprender significa antes de tudo PENSAR sobre como determinadas perguntas possuem diferentes respostas de acordo com o caminho escolhido. Ensinar a APRENDER é muito mais dificil, já que não existem fórmulas e respostas prontas. Aprende-se quando se sabe fazer a pergunta certa. Já a resposta não é necessariamente certa ou errada… é um caminho.

A Pandemia escancarou outras mazelas: ora temos infinitos recursos tecnológicos subutilizados, ora estes não atingem ampla maioria da população discente. A pandemia, de repente, mostra uma distopia tecnológica: afinal, o mundo inteiro se conecta via aplicativos, o home office é uma realidade e tudo funcionando às mil maravilhas. Mas nos esquecemos que nosso país possui extremos econômicos, sociais e tecnológicos. A nossa bolha tecnológica não consegue entender que a maioria esmagadora dos alunos não possuem celulares. Se os possuem são em geral, pré-pagos com planos que simplesmente não comportam pacotes com dados suficientes para baixar o que quer que seja. As casas não possuem redes wifi, e muito menos computadores e locais adequados para que as crianças estudem.
Do outro lado, temos professores desesperados que precisam lançar mão do que possuem. Em muitos casos, só conseguem usar o whatsapp. Ou seja, o ensino chega mutilado, picotado e estilhaçados em inúmeras dificuldades.

Além desta desigualdade ampla e irrestrita aos meios tecnológicos ficou patente que não é a tecnologia que faz pensar, inova, cria, produz… quem faz isso são mentes pensantes, com espírito inquieto e perguntas assertivas. As tecnologias podem oferecer ferramentas muito interessantes, mas nem toda solução é tecnológica, em especial quando lidamos com pessoas.
Ironicamente, a tecnologia está mostrando o quanto existe deficiência intelectual e cultural entre as pessoas, que em tempos passados não se sentia exatamente porque todos tinham que ler e estudar mais, já que não havia o onisciente e onipresente Google para tudo. Criou-se uma geração preguiçosa, acomodada e impotente diante de resolução de problemas pequenos e cotidianos. Se não há uma tecla com a resposta as pessoas ficam paralisadas.
De outro lado, vejo pessoas robotizadas, engessadas e com pensamentos limítrofes para quase tudo. Deixar de ensinar a aprender está causando danos irreparáveis há uma geração inteira.

A Educação precisa ser entendida como um investimento de longo prazo em pessoas que estimulam o pensamento crítico e criativo e não apenas dizer que são necessárias tecnologias. As tecnologias sem estes cérebros pensantes serão de pouca utilidade, e serão usadas como uma continuidade de um ensino massificado, mediocrizante, tal como o que acontecia com lousas de pedra e escrita em giz.

A Pandemia veio mostrar que a Educação NUNCA mais será a mesma, e que muito pode ser feito sem ser em uma sala de aula construída em alvenaria. O mundo digitalizado às pressas nos faz perceber que há muito o que ser feito e aprimorado, e que a fantasia tecnológica morre de inanição em presença da falta de criatividade.

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Pesquisa: Educação escolar em tempos de pandemia na visão de professoras/es da Educação Básica

* Post publicado originalmente no meu Blog, o Pensados a Tinta

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Quino & Mafalda: Eternos

Por: Eliana Rezende Bethancourt

Estranho como uma relação entre criador e criatura pode ser tão forte e simbólica.

Ainda ontem relia este artigo que escrevi quando Mafalda se tornou cinquentenária (Setembro, 2014). Para minha surpresa, um dia após o aniversário de surgimento, o Sr. Joaquin Salvador Lavado, o Quino, nos deixa. Ele falace exatamente um dia após o aniversário de criação de sua eterna Mafalda.

O que nos fica?

Como uma boa ideia com humor e crítica ácida à mistura podem render bons anos de vida? A resposta em uma única palavra é: Mafalda. Contestatória, politizada, insatisfeita com o mundo. Sempre cheia de questões e inquirições. Uma ardorosa aversão às sopas. Niña esperta, espontânea, sabida, verborrágica: sempre com muito a dizer.

Mas a garota apesar de manter-se uma menina nas tiras é uma cinquentinha.

Considero que a coisa interessante no caso da personagem é sua sobrevivência no tempo a partir de uma boa ideia e doses de “realidade”. A atualidade está exatamente em explorar as vivências e angústias de todos,  independente de onde ou como vivam. É um questionamento para um mal-estar que nós latinos entendemos tão bem. Penso também sobre sua estabilidade e permanência em um mundo feito de tantas obsolescências e descartes. O que a torna ainda tão factível?

A primeira coisa que me vem à mente é exatamente essa inteligência ingênua, antenada e bem humorada que lhe confere tanto sucesso e permanência até hoje.

A politização com crítica mordaz dão um tom todo especial e, independente do país e da idade, nos identificamos com seus pensamentos.

Mafalda dentre tantas coisas não é apenas e tão somente um personagem de tirinhas. Nasce como personagem de campanha publicitária e emancipa-se pelas tirinhas. Ela representa toda uma sociedade (no caso a argentina) do final dos anos ’60 e começo dos anos ’70. Uma sociedade que vive em ditadura de suas fronteiras, e que vê os países vizinhos vivendo a mesma situação. Assiste a uma guerra em andamento no Vietnã e os EUA em plena expansão imperialista.
As tirinhas eram publicadas diariamente e sempre se relacionavam aos eventos cotidianos ocorridos na própria Argentina, na América Latina ou no mundo. Era portanto, produto de um contexto social, politico, econômico e trazia muito da própria personalidade de Quino, que era em sua essência um contestador e crítico da sociedade em que estava inserido. Mafalda externava todo este DNA de seu criador. Era ela que dava voz ao mundo efervescente em que estavam.

A sociedade é confusa para seu olhar: não sabe bem porque há uma guerra no Vietnã, inocentemente se preocupa com a presença dos chineses, não sabe o porque de tantos pobres em volta, desconfia da mídia (jornais, revistas, TV) e do “Estado” (militar) e só consegue ter clareza de que não se conforma!

O mundo, sob sua ótica, está doente e ela anda às voltas com a busca para solucionar o que está errado. Cercada de adultos, não consegue compreender porquê os pais e todos os outros permitem e estragam o mundo.  Nada fazem.

Os colegas não lhe trazem maiores respostas e aparecem como síntese de visões pequeno-burguesas: Manolito, que apesar de coroinha, tem como principal valor o dinheiro. Felipe é o sonhador romântico de plantão e Susanita convertida ao espírito de um consumismo burguês.

A convivência com estes já não era fácil, mas chegam os dois mais novos integrantes de sua turma: Libertad, responsiva mas muito pequeninha e o Guille (irmão caçula de Mafalda) capaz de dormir ouvindo rock e se deslumbrar por Brigitte Bardot.
Era o fim para Mafalda!

Diante de tantas contradições, talvez seja simples compreender o porque de tantas inquietações e verborragias trazidas por ela.

Imagino o quanto Mafalda se indisporia com o mundo em conexão e redes ditas sociais, os conflitos que ainda alimentam a fome imperialista americana e como direitos humanos continuam sendo violados. Não é mais só o Vietnã! Proliferaram países, guerras, lutas e motivações. Temos a Síria, Palestina, Croácia, Coréia, Irã, Iraque e por aí segue. Os pobres e desvalidos pela fome, pela guerra, pela discriminação de todas as ordens e faces (religiosas, étnicas, culturais, de gênero, sociais), doenças convertidas em verdadeiras epidemias aumentam dia a dia.

O planeta geme de muitas formas: há tempestades, tufões, furacões, tsunamis, secas prolongadas, queimadas. A política cada vez mais corrupta e sem limites éticos, morais, valores. Uma incompreensão sem fim.

Sim, é há a mídia. Agora não apenas impressa ou televisa. Chega de todas as formas. Uma explosão de sentidos e significados, e a desinformação cada vez mais usada como tática para atingir seus fins.

Temos que pensar que Mafalda surge na mesma época em que a televisão surgia e trazia ao debate sobre os meios de comunicação de massa e o quanto imprimiriam novos comportamentos à sociedade em geral. Sua resistência aos meios de comunicação como meios de manipulação mostram este desconforto que era vocalizado dia-a-dia nas questões de Mafalda.

Quantos temas!
Mafalda teria muito de que se ocupar.

Mas acho que o que menos interessa é a idade em si. A comemoração mostra o quanto essa personagem tem eco em diferentes sociedades. Esse eco reforça a concepção de que uma boa ideia desenvolvida com inteligência sempre é bem vinda! Em geral, interessa pouco a procedência do personagem. É este vigor o que comemoramos. É esta forma simples, direta, e de traços igualmente simples que comemoramos. Afinal transmitir ideias e inquietações pode até ser divertido. Quino e Mafalda nos mostraram isso por mais de 50 anos!

Ela faz aniversário, mas quem ganhou o presente fomos nós! Afinal, Mafalda chegou numa bagagem trazida pelos adolescentes dos anos 60/70 e apresentada aos adolescentes atuais pelos sessentões de hoje. O ideário da personagem não envelheceu e se mantém tão moderno como quando foi apresentado pela primeira vez em 1964. As aspirações, angústias e questionamentos continuam os mesmos.

E aí vejo uma outra metáfora para a nossa Mafalda. O tempo não precisa ser tirânico e nem amedrontador. Basta apenas estar em sintonia com seu tempo. O vigor não precisa de botox e outras plásticas, que na verdade só cuidam do que é externo. Sua juventude vem de uma mente sã, perspicaz, concatenada com a atualidade do seu tempo e suas complexidades. Perigosamente generosa!

Da minha parte, partilho com Mafalda a inquietude, questionamentos, politização com a existência e uma necessidade imensa de troca. Talvez por isso, goste tanto dos Grupos, de Debates e da escrita. Me dão combustível para alimentar e saciar minha sede por perguntas e busca de respostas. 
Assim sigamos, pensando, trocando e buscando argumentos e quiçá consigamos a longevidade e perenidade de Quino e Mafalda: criador e criatura!

Este aniversário fica mais triste, pois o Sr. Joaquín, o Quino nos deixa…
Mas está eternizado em nossas mentes e corações….

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Dica de Leitura:

Mafalda e a televisão: a comunicação de massa nos quadrinhos de Quino 
Mafalda e Quino 

* Post atualizado a partir de publicado originalmente no meu Blog, o Pensados a Tinta

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Você ainda Escreve Cartas?

Por: Eliana Rezende Bethancourt

Provavelmente se você for de uma geração que passou pelo analógico dirá que parou há muito tempo. E se for de uma geração um pouco mais recente dirá que NUNCA escreveu ou recebeu uma carta que não fosse um aviso de cobrança ou um cartão magnético.

Apesar disso, houve um tempo em que as cartas possuíam um ritual de produção e atenção. Eram artefatos para os sentidos. Muitos poderão se lembrar dos envelopes perfumados? Lembram-se deles?  Mas e agora, quando muitos não fazem ideia do que seja este tipo de troca?

Continue comigo por estes caminhos de memórias e sensibilidades, e quem sabe, se inspire!

Vejamos:

As formas de escrita sempre encontraram diferentes suportes e as cartas tal como os diários, representam uma forma de escrita ordinária onde imprime-se com o que se sente. As tintas, papeis, selos formam um conjunto que dizem tanto como as palavras. A materialidade dá as palavras um sentido de eternidade, de permanência.

Por isso, como historiadora meu olhar se fixa em detalhes que me informam sobre  remetente e receptor, sobre contextos de produção, circulação e guarda de formas documentais únicas e pessoalizadas. Registram fortemente laços, emoções e compõe junto com tantos outros o que história se chama de cultura material.

Carta mais antiga!

Para além disso, a relação com a escrita neste caso específico, é uma relação tátil e de afetos. Sob esta ótica, chegava a ser ritualística e envolvia um tempo cíclico composto de começo, meio e fim (não apenas em sua produção, mas em todo o circuito envolvendo o recebimento e sua guarda). Exigia uma composição que ia desde a escolha do tipo do papel, a tinta, o cunhar as palavras de próprio punho (em muitos casos, exercício árduo de boa caligrafia, praticada como arte ou prece em diferentes civilizações: como a árabe, chinesa, egípcia, mesopotâmica), a busca de um envelope que não alterasse o conteúdo fragilizado por formas de dobras e, óbvio: filas nos correios, compra de selos, o uso das colas e finalmente o encontro com uma caixa que servisse de fiel depositária até que esta encontrasse seu destinatário.

O recebedor da carta inspecionava quem lhe havia remetido, de onde, em que data e há quanto tempo ela viajava ao seu encontro, os selos e carimbo de registro indicavam o local e data de postagem, e por uma aritmética simples se sabia o tempo transcorrido entre envio e recebimento. Havia caminhos trilhados que seguiam por rios, mares, trilhas e montanhas. Podia levar dias ou até mesmo meses. A escrita em traços duráveis e em espaço íntimo trafegava por espaços públicos, de mão em mão, de pessoa em pessoa até o seu destinatário.
De fato uma grande elaboração!

Com tal caminho lento e tortuoso, sua leitura merecia igualmente uma liturgia: por isso não seria aberta em qualquer lugar ou diante de olhares inquiridores ou curiosos. Uma carta sempre significou algo pessoal e absolutamente privado, de interesse apenas ao seu destinatário. O melhor lugar poderia ser um escritório, uma sala, um quarto ou um canto qualquer num jardim ou espaço de conexão entre remetente e recebedor. Era ali, neste espaço quase sagrado, dado que privado, que era lida, relida e muitas vezes guardada afetuosamente entre os principais valores pessoais de cada um. Algumas continham o perfume dos papéis e até objetos que eram-lhes acessórios (pétalas, desenhos, e outros objetos que teciam com a carta os seus sentidos). A resposta quase nunca imediata necessitava do tempo da elaboração. Era preciso buscar todos os utensílios da escrita para além das palavras que expressavam de fato o sentido ao dito. A conexão propiciada entre tais objetos e os laços representados foram, no decorrer da história largamente representados por ficções literárias, teatrais e até cinematográficas. Sempre serviram de pano de fundo para enredos de afetos, amores, intrigas, ciúmes e todos os sentimentos mais humanos possíveis.

Como historiadora, todo este trânsito é fascinante e passível de muitas “leituras”. São modos de viver, pensar e produzir culturalmente: modos de estar. Uma carta tem a marca da cultura material que a produziu e por isso, é detentora de uma materialidade que conta algo único. Se inscreve no tempo e com todas as técnicas e tecnologias que este tempo possui: a letra cursiva que se debruça sobre um tipo de suporte composto pelo papel, pelo envelope, pelos selos, pela tinta e caneta utilizada. Mas também se inscreve como um conjunto de ideias e pensamentos justapostos para comunicar sentimentos, ordens, deveres, saberes, e tudo o mais que se possa compartilhar de forma pessoal e intimista.

Hoje, em tempos de tanta imediaticidade e consumo, tudo passa muito rápido, com economia silábica e fonética. As palavras deixam de ser pensadas e as correspondências giram em torno do imediato. Roubou-se a aura da palavra cunhada e da magia que seus complementos tinham (os selos, os papéis, os timbres, as tintas, o rebuscado de letras e formas, sua sinuosidade e curvas particulares).

A comunicação fonética é feita de modo a favorecer uma economia silábica para tipos impressos de formas mecanizadas, homogênicas e universais, produzidas com tintas de toners recicláveis em papéis produzidos massiva e monotonamente na mesma cor, padrão e gramatura. Em geral, tais escritos não chegam, além da materialidade digital e só em alguns casos conhecem as tintas. Seu tráfego vem por meio de trilhas digitais, que não levam mais que alguns segundos para chegar ao seu receptor. As informações destas mensagens, seus contextos de produção e circulação chegam através de metadados e com a passagem do tempo se perdem numa malha de desimportância, sufocada pelo acúmulo constante de mensagens que se justapõem.

Escrevi muitas cartas (imagine o trabalho que tive pelo tanto que sou prolixa!!!), recebi muitas e experimentei o prazer de estar longe do Brasil e aguardar ansiosa que alguma me chegasse. No período coexistia com e-mails, mas cartas ainda circulavam como última resistência a um mundo que insistia em mudar ante nossos olhos.
A adaptação houve. mas ainda tenho muito vincada em mim a experiência da escrita de próprio punho e as cartas para envio e comunicação.

Em meu ofício como historiadora e arquivista, já tive às mãos cartas escritas por pessoas que morreram há séculos, e tenho que dizer que é uma emoção ver ali a tinta impressa com a energia dos punhos de alguém como, por exemplo, Mário de Andrade. A forma como a caneta tinteiro modifica seus tons e como o papel vai ganhando um tom sépia à medida que o tempo passa. Uma carta em um acervo ganha tons e odores do Tempo e não fica indiferente a ele. É como ter entre os dedos notas de um passado pego num lapso de tempo no aqui e agora.

Os tempos hoje são outros:

Desaparecimentos e perdas são usuais e muitas vezes, temos a ingrata surpresa de descobrirmos que nossos conteúdos digitais foram para além das nuvens.

Obsolescências, superficialidades… pressa. São muitos os males que atingem nossas comunicações. Como disse, a relação é tátil e sensorial própria de um tempo que talvez tenha passado. Para nós, homens e mulheres de um tempo de transição, é às vezes difícil verificar como tudo passou tão rápido por nós.

Apesar de tudo, tento pensar que a qualidade dos textos se preserva e que apenas os suportes se alteraram. Mas infelizmente, todo o código social e cultural em torno dessas produções se alterou para sempre. O tempo dirá com quais resultados. Acho que o principal componente de todo este ritual de sensibilidades e cuidado era exatamente o Tempo e atenção dispensada ao seu preparo. Um verdadeiro mosaico de muitos prismas e sensações.

Você poderia perceber a atenção em cada detalhe material: o papel escolhido e sua textura, a tinta enquanto espessura e cor, letras trêmulas ou incisivas, as formas de dobra e até o tipo de envelope. Era tempo dispendido para comprar um selo, ir até uma agência dos Correios e lá postar. Tudo denotava cuidado, esmero, atenção e principalmente um dos recursos mais escassos que temos: tempo.

cartas-de-amor1

Hoje, a volatilidade é grande. Com os meios digitais apascentou-se o espírito ansioso. Mas, e todo o “conjunto da obra”? Como referir a emoção que, às vezes tínhamos quando víamos o carteiro? Lembro-me de ter corrido atrás deles algumas vezes com receio de que minha carta não chegasse.

Bons tempos…

Como falar disso a um natodigital?! Eles de fato não saberão, infelizmente, como é isso. Não serão nunca capazes de compreender o significado disso tudo, especialmente porque sua relação com o mundo tem muito mais que ver com toques, teclas. Enviar e apagar estão no mesmo espaço que os tipos gráficos para a escrita.

Acho que uma amarração fantástica para este tema sejam os filmes “O carteiro e o Poeta”  e “Central do Brasil” . O sentido das cartas que tecem vida é uma deliciosa lembrança e uma forma belíssima da ficção encontrar a escrita.

Estamos no mundo atual vendo a conformação de uma nova relação com as formas de escrita, seus suportes e os modos pelos quais nos relacionamos com nossas correspondências ordinárias. É um patamar de mudança cultural, e por isso é tão afeito aos nossos esquemas sensoriais. E por ser sensorial, imprime em nós muitas emoções e sensações. Não há nada de errado em uma forma ou outra. O que de fato importa é que a comunicação se estabeleça. Óbvio está que se vier com mais elementos que alimentem o sensorial, melhor! Anteriormente tínhamos todo um conjunto de códigos de posturas, que davam uma forte dimensão de “valor” ao que imprimíamos em tinta, era uma escrita de próprio punho com as inconstâncias e oscilações do que nos vinha pela alma. Hoje a escrita padronizada e eletrônica tira isso e muitas outras coisas… mas é uma passagem, e como tal precisa ser trilhada…

A experiência da escrita, interlocução e troca é uma das grandes aliadas no alargamento do espírito. Nos oferecem olhares que de onde estamos não enxergamos. Por isso, o tempo despendido em cada comentário, em cada correspondência tem valor agregado que não possui cifras, é intangível. 

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O tempo da vida e as palavras que a nomeiam dão formas ao sentido e ao vivido pensado.  Nominar é, em última instância, “trazer à existência”. São com as palavras que expressamos ideias, sentimentos, projetos, sonhos, expectativas, reflexões, tecemos críticas e construímos pontes entre o sensível e o visível. Tudo isso as tintas fazem por nós. De punho ou em um jato de tinta contam ânimos e prismas de mundo. Com elas construímos e partilhamos o saber e o conhecimento. Construímos mundos…

Nas cartas havia todo o conjunto de sentidos que partiam junto com os escritos e daí talvez toda a sua magia. Eram remetidos com elas pedaços de nossas existências compostas, muitas vezes, com folhas secas, pétalas, fotografias, bilhetes de ingresso de lugares incríveis e até beijo feito em batom! Elas são de fato auxiliares sensoriais por onde nossas memórias encontram as vias de acesso ao passado.

Por isso, considero as cartas, tanto quanto fotografias e demais objetos de cultura material como de valor inestimável, e no interior das instituições devem ser consideradas pelo que são: Patrimônio Cultural/Documental que precisa ser preservado e cuidado para as gerações futuras. Informam, vincam e fortalecem a Cultura e Identidade destas Instituições e são a garantia de que vencerão o Tempo.

Por isso, se possui um acervo com tais preciosidades, não hesite em nos contatar. Teremos um prazer imenso em ajudar a como tratar e fazer falar tais mensageiros do Tempo.

COMO PODEMOS LHE AJUDAR?
Se você possui um acervo que seja Patrimônio Cultural/Documental e não sabe como zelar por ele, entre em contato com a ER Consultoria. Teremos enorme prazer em pensar numa Solução customizada para as suas demandas, ou para o tratamento técnico documental de acervos documentais e fotográficos e sua preservação e conservação.

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* Versão revista e atualizada de post publicado originalmente no meu Blog, o Pensados a Tinta

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O Valor do Conteúdo: uma reflexão

Por: Eliana Rezende Bethancourt

A questão da produção, circulação e valor do conteúdo em ambientes digitais é um tema que interessa muito e que é fundamental quando pensamos os ambientes em que estamos inseridos, sejam eles institucionais, públicos ou privados, sejam os meios educacionais e culturais. Em outras oportunidades, falei sobre qual seria o perfil do Gestor de Conhecimento e o que seria a Curadoria de Conteúdos: quem faz e como faz.

Nesta oportunidade especificamente não me refiro à produção de Conhecimento.
Para mim, tal produção requer algo muito mais aprofundado do que a mera explicitação de conteúdo em ambiente web. Tais conteúdos são relevantes para a circulação de informação e ideias, num ambiente mais ágil que pode levar eventualmente seus consumidores e interlocutores à uma reflexão, que pode originar a produção de uma abordagem mais elaborada. Esta sim podendo ser considerada a produção de Conhecimento, que em geral, será comunicada a partir de artigos acadêmicos e/ou científicos, e que portanto, de maior fôlego para veículos próprios para isso e que alcançarão um público mais especializado e gabaritado para interação e divulgação na sociedade.

É preciso que se diga que o mundo em web oferece muitas possibilidades para a produção de conteúdo, muitos deles bastante relevantes, mas como não transformar nossa produção apenas em ruído? Como não permitir que tal produção de conteúdo signifique, apenas e tão somente, mais registros e informações que se convertem em infointoxicação, um excesso que apenas causa ruído e não favorece aquilo que chamamos de valor? Entropia.

Facilidade e imediaticidade tornam os conteúdos, muitas vezes, massivos, repetitivos e na maior parte das vezes muito raso. Muitos não chegam a dois ou três parágrafos mal desenvolvidos e/ou suportados por bons argumentos e consistência.

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De tanto ver chego a conclusão que os conteúdos em ambiente web oferecem pelo menos três dimensões de produção e propagação. Seriam elas:

Primeira, a dimensão horizontal, que é aquela que ao produzir conteúdos busca-se em outros sites e portais mais informação. É um universo de produção onde se aglutinam informações sobre informações para deles extrair mais conteúdo. Em geral, esta dimensão procura, nos seus iguais, informações para ou contestá-las ou fortalecê-las aliando-se a elas. O esforço aqui é muito mais quantitativo e por aproximação. Mas na maior parte dos casos não representa um diálogo. Neste horizonte, se não se tomar os devidos cuidados, o que acabará ocorrendo é uma cópia simplificada e rasa, ou ainda pior: um plágio por pura preguiça ou má fé.
Neste universo, o produtor ao invés de inspirar-se nos conteúdos encontrados e mostrar outras abordagens, ou aprofundar os mesmos, simplesmente cola e copia.

Segunda, a dimensão vertical. Nela há um maior aprofundamento dentro de uma determinada linha temática. A verticalização aprofunda na medida em que esquadrinha, disseca e verticaliza cada uma de suas variáveis ou aspectos. Em geral, o recurso à verticalidade dentro de um site ou portal é aprofundar temas levantados de forma superficial na abordagem horizontal citada acima. Representa, em verdade, uma tentativa de adensar alguns aspectos onde a horizontalidade não permitiu.
Quando este exercício é bem executado a produção de conteúdo começa a ganhar consistência e valor. Aqui o produtor não é um mero reprodutor do que encontrou. Começa a buscar conexões possíveis e avança, ainda que em uma única direção.
O cuidado aqui é não tornar-se monotômico e falar SEMPRE DA MESMA COISA. Isso irá dar a sensação de que o produtor de conteúdo ao invés de ser um especialista é alguém com profundos receios e inseguranças, e que só é capaz de se movimentar dentro de um quadrado bem delimitado de ideias e concepções. Acabará por também limitar e circunscrever seus leitores, que diante de tantas ofertas migrará para outra parte por começar a achar que nunca há novidades e que sempre tem-se a impressão de já ter lido aquele conteúdo.
Note que aqui o conteúdo talvez seja mesmo bom, mas a monotomia oferecida fará com que o desinteresse passe a predominar e o valor deste conteúdo diminuirá cada vez mais.

E, por último temos a dimensão transversal, que é exatamente a busca de expandir ideias para além de suas fronteiras e encontrar em informações correlatas formas de ‘alargar’ conteúdos. Neste caso, entendo que uma ou mais linhas de verticalização serão cruzadas e expandidas em outras direções a partir de outros conteúdos produzidos por outros. Assim funciona de forma muito parecida com os recursos de hipertextos que usamos em várias circunstâncias.
Para a produção de conteúdos esta dimensão é que possui maiores chances de produzir conteúdos relevantes, interessantes e diversos.
Aqui o produtor de conteúdo mostrará ousadia e estará incessantemente se desafiando e desafiando seus leitores à novos horizontes e ideais. A imaginação e curiosidade serão seus maiores trunfos, tanto sua quanto de seus leitores. Sua imaginação criativa e curiosidade o lançarão há novos horizontes que o desafiarão a estudar e conhecer outros caminhos e possibilidades, de outro lado, a sua curiosidade o alimentará na mesma proporção que seus leitores serão incentivados à ela.
Atingir este ponto é altamente compensador e os resultados visíveis.

Esta estratificação permite que a informação seja produzida e trafegue por várias instâncias, e que em especial, atenda diferentes públicos e melhore seus objetivos. Apesar disso tudo, aflige-me a superficialidade que os tempos de web oferecem. Anteriormente esta produção tinha apenas um matiz que era a forma escrita. Rapidamente ganhou formatos de hipertextos e links, para seguir por outros formatos como os podcats, vídeos sua febre mais atual, as lives. Independente daquilo que seja seus meios ou suportes de veiculação, algumas perguntas necessitam ser feitas:

Não teríamos que ir mais longe e mais fundo?
Pode ser, mas como ir contra toda uma tradição onde o mundo é compartimentado em pequenos extratos e partes, a que se chama especialização?

O que se passa?

Este compartimento esquadrinhado que o “Saber” acabou nos colocando nos leva a um ponto de limitação. O grau de especialização tornou as pessoas muito mais suscetíveis a saberem cada vez mais de uma coisa só, e este é apenas um lado da questão.
De outro lado, e não menos importante, está a defesa desta compartimentação devido às inúmeras concepções sobre o que vem a ser conhecimento.

A produção de conteúdo objetiva sempre atender um determinado público, e este a cada dia é mais diversificado na mesma proporção em que é desatento. As pessoas, que em geral, são as receptoras destes conteúdos: basicamente planam sobre os temas que são de seu interesse quicando aqui e ali sem de fato se concentrar no que busca.

Há ainda os que definitivamente não sabem o que procurar. Simplesmente esperam lançar uma palavra e lá encontrar, tanto as perguntas quanto as respostas, mesmo que não sejam as suas.

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Fico muito preocupada ao constatar que há uma massa monumental de pessoas que mesmo longe de áreas de formação, mas sim inseridas no mundo social, também acabam por preferir parcelas segmentadas de tudo. Um planar sobre tudo e uma real impossibilidade de seguir profundamente algo.

O ambiente web e todas as suas potencialidades deveriam fazer as pessoas conseguir ir mais longe, mais fundo e com muito menos fronteiras e limites. No entanto, o que vejo se configurando nesse ciberespaço é exatamente o contrário disso tudo. Talvez tenha sido essa a minha motivação de proposição: afinal porque está sendo cada vez mais difícil encontrarmos conteúdos relevantes? O que falta?
Porque será que cada vez mais as pessoas deixam de se importar e até preferem que os conteúdos sejam cada vez mais sintéticos, em nome de uma pressuposta objetividade?
É a irrelevância o maior objeto de consumo?

Mas Conhecimento não é consumo!
E aí temos um nó górdio. Nossa atual civilização se importa muito pouco com o Conhecimento. A informação massificada e generalizada à toque de uma ‘Goolgada’ leva as pessoas tanto a consumir como a produzir platitudes. A preguiça intelectual é generalizada e mantém conteúdos massificados, rasos e rápidos. As lives nos dias de hoje, tem sido um bom exemplo de platitude com pressa à mistura. A ânsia de achar que “inova” com uma resposta rápida para consumo imediato leva ao engodo de uma proliferação sem sentido e medíocre de lives para tudo e qualquer coisa. Cansam pela proposta rudimentar de repetir o mais do mesmo.

E ainda há a preguiça da produção de conteúdo de valor e original. A sociedade do copia e cola tem muitos problemas no que concerne a produção de ideias inéditas ou que ofereçam abordagens diversas das que estão em voga. Aí é muito comum nos deparamos com o pior que a produção de conteúdos pode conter: o plágio.

A questão de autoria na produção e valor do conteúdo

Atualmente a noção de autoria e produtor de conteúdo parecem confusas e se notarmos até a Lei de Direitos Autorais votada no Brasil em 1998 apresenta sérias confusões em relação a isso. Já que o produtor, em especial na web, faz isso com espírito de compartilhamento, doação em beneficio de uma “coisa pública”. Em geral, não está preocupado com a autoria porque acredita que essa é apenas uma variável entre muitas possibilidades.

Ou seja, de um lado há a ideia da generosidade de doação por parte de uns e a má fé irresponsável por parte de outros, onde deixa de creditar uma ideia, um pensamento e assim por diante.

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Fica claro portanto, que há muitas interfaces a ser tomada em consideração na produção de conteúdo.

Mas produzir conteúdo não é tudo! Sou adepta de que é preciso produzir com qualidade.
Não consigo pensar na produção de conteúdo como sendo algo sem interesse, verticalidade e profundidade, ainda que para um post que integrará um portal ou um site ou mesmo uma live.

É óbvio que é necessário criar formas de registro simples, eficientes, acessíveis e -insisto neste ponto – altamente compartilháveis, seria uma solução. Mas por outro lado, e também muito importante, seria necessário mudar a atitude dos mortais em relação ao acesso a estes registros, estas informações, e desses conhecimentos gerados.

De um lado, teríamos uma atitude que deveria ir na direção de ser capaz de veicular informações sólidas, mas de forma acessível para que cada vez mais pessoas se interessem pela consistência. Aqui a questão de saber comunicar é fundamental. A magia está em tornar simples e palatável algo que definitivamente é profundo e complexo. A mediação aqui do produtor de conteúdo é fundamental. É dele a função de agregar valor ao que expõe. Fazendo isso produz-se um círculo virtuoso de valor e não um circulo vicioso de platitudes que não servem para quase nada.

O produtor de conteúdo tem que compreender que seu papel é comunicar ideias relevantes. Pode ser um eficiente mediador entre a circulação de informação e a produção de conhecimento.

Por isso, cada vez mais sinto falta do sentido de humanismo ao qual me filio e gosto de adotar, ou seja, esse sentido de que não se deve excluir nunca. Temos sim que comunicar e intercambiar áreas, saberes, perspectivas. Oferecer sempre portas para que mais descobertas se deem. Não cabe ao produtor de conteúdo a última palavra. Ele é apenas um veículo, um facilitador para que mais conteúdo seja produzido, ainda que seja na direção oposta à sua.

Este mundo segmentado, compartimentado e fechado em si não pode ir muito longe ou avançar a outros horizontes. Quando deixarmos ruir todos esses compartimentos e muros, erguidos por vaidade ou ignorância, aí sim o Conhecimento será definitivamente algo democrático de ser alcançado e sonhado por ampla parcela de pessoas e/ou organismos.

Como podemos ajudar?
Na ER Consultoria possuímos metodologia própria, conhecimentos testados e experiência prática para auxiliá-lo na melhor configuração de uma Arquitetura de Informação para o seu Portal Institucional ou mesmo em como proceder a produção e curadoria de conteúdos que de fato atinja seu público alvo.

Veja nosso Portfólio de Cases e o que nossos clientes tem a dizer.

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