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Os Analfabetismos do Século XXI

Por: Eliana Rezende Bethancourt

De uma sociedade que chegou a ser chamada de sociedade de informação temos nos convertido num exército de analfabetos surgidos do modo de viver digitalmente neste principio do século XXI. 

O volume avassalador de informações produzidos e reproduzidos em rede tem mostrado o quanto quantidade tem sido inversamente proporcional à qualidade.
O desenho propiciado por plataformas e aplicativos digitais favorecem que as informações fragmentadas possam circular em grande quantidade e fazer um rastro imenso em diferentes camadas da população. Este estilhaçamento faz com que a mesma informação alcance nichos diversos com capacidades diversas de lidar com tais fragmentos.

Ou seja, apesar da possibilidade de maior velocidade de compartilhamento tais registros não primam por reflexão e aprofundamento. É um plainar raso sobre todo e qualquer tema. Com um outro agravante: em segundos e um clique todos se convertem em especialistas de TODOS os assuntos e temas, em vários casos, com perspectivas e defesas tão apaixonadas que podem gerar muito barulho e furor.

É óbvio que as redes surgiram para interação entre pessoas, e tinham como principal objetivo agilizar assuntos sem aprofundá-los. Era algo muito interessante inicialmente. O que ocorreu a seguir foi começar a se converter na única forma de comunicação em diferentes ambientes. De rodas de conversas entre amigos e familiares, sua adoção foi por outros setores e rapidamente foi tragada por ambientes institucionais e até educacionais. 

Tudo isso somado: superficialidade + agilidade resultou em uma gama imensa ou de publicidades de todas as ordens, em especial as indesejáveis, e de outro muuuita desinformação. O pulo para desinformação foi favorecido exatamente por esta incapacidade de ler e ter crítica sobre o que se lê. Atentem que a palavra crítica aqui possui aquele sentido de ser capaz de aprofundar um tema ou assunto por que a pessoa se deteve e estudou para aquilo, a boa crítica deveria se assentar em argumentos e bons fundamentos.
Mas não é o que temos.

O fundo deste problema é uma geração inteira que nasce e cresce num ambiente onde as redes sociais dominam e a elaboração de um pensamento crítico e aprofundado é cada vez mais abandonado. 
No geral, e propiciado por tais comunicações rápidas das redes, os mais jovens mostram uma quase incapacidade de concentração, análise e reflexão sobre um determinado tema. 

“A atenção fragilizada e dispersa somada a incapacidade de pensamento reflexivo nos leva diretamente  aos mais novos analfabetos do século XXI. O analfabetismo aqui tem rastros e vícios digitais. Muitos não conseguem se quer escrever com letra cursiva ou escrever corretamente sem um corretor ortográfico acionado. Pensamentos mais complexos e correlacionados quase ficam inviabilizados e o exército destes analfabetos aumentam dia a dia  e são facilmente mensurados no número de desempregados ou sem profissões. Muitos não conseguem reunir o mínimo necessário para se capacitar e desenvolver um pensamento mais abstrato e robusto”. 

Por: Eliana Rezende Bethancourt

Não confundir esta forma de analfabetismo, que é a incapacidade de formular raciocínios mais complexos e profundos em direção ao pensamento mais reflexivo e critico com o que denominamos analfabetismo digital.

Neste caso, o analfabetismo digital se refere à ausência de acesso aos meios digitais. São pessoas que mesmo alfabetizadas no sistema tradicional não conseguem usar e se valer das diferentes tecnologias digitais. Possuem dificuldade em utilizações básicas de editores de textos, planilhas, visualização ou produção de documentos em meios digitais.  

O analfabetismo digital está intimamente relacionado à pobreza.
A tecnologia não é um sistema igualitário e sua manutenção e atualização exige recursos. Quem não os possui será automaticamente alijado de todo o sistema.
Neste sentido, o analfabetismo digital é mais uma face da desigualdade social, cultural e econômica que aflige milhões na humanidade. 

Convivendo com tais formas de analfabetismo temos o mais popular de todos e que precede os que abordamos até aqui que é o analfabetismo funcional.

O analfabetismo funcional vem se transformando num clássico entre diferentes níveis de escolaridade, pois atinge de forma irrestrita uma grande gama de todas a população supostamente escolarizada.

O analfabetismo funcional pode se manifestar de diversas formas, mas as mais usuais são os casos em que o individuo de fato aprendeu a ler e tecnicamente aprendeu a fazer uma leitura pragmática envolvendo seu dia-a-dia, mas que não é capaz de interpretar um texto ou compreender subtextos. O analfabeto funcional possui seu diploma, mas é incapaz de ter um raciocínio bem elaborado ou fundamentado sobre um tema, não é capaz de construir argumentações ou fundamentações valendo-se de seu aprendizado.

Por isso, é usual encontrarmos analfabetos funcionais em níveis considerados superiores, onde a pessoas passam por processos de alfabetização, consegue ingressar em cursos que não exigem tanto em seus processos seletivos, e por isso, serão incapazes de exercer suas profissões porque simplesmente não conseguem ir além da mera leitura.
Não constroem ou elaboram a partir do que aprendem, e por isso, também não são capazes de emitir posicionamentos ou pesquisas circunstanciadas sobre o que quer que seja.

Vê-se que quando temos estas sobreposições de analfabetismos estaremos diante de um grande problema não apenas escolar mas sociocultural.

É preciso compreendermos as diferentes camadas de que são feitos tais analfabetismos, para que em todos os casos seja devolvido a estes atores a possibilidade de ter pleno acesso e cidadania social, cultural e digital. Sem compreender isso, estaremos mergulhados num pântano de preconceitos nebulosos e total incapacidade de viabilizar informação para a produção de conhecimento.

De tudo o que foi mencionado, fica claro que todos aqueles que se dedicam aos temas acima e suas conexões com a Educação terão obrigatoriamente de tomar em conta os caminhos de desigualdade social que atinge nossa população de forma avassaladora.
A partir da pandemia de Covid19 todos estes elementos se entrecruzaram e revelaram um país com muitas dificuldades e obstáculos a vencer. Foi escancarado o que já institivamente sabíamos: os fossos educacionais se estreitavam cada vez mais quanto mais carentes eram os públicos.

Milhões de alunos ficaram completamente reféns de uma situação que mostrava aos quatro cantos que seus pais e outros membros de sua família sofriam de vários níveis de analfabetismo e que pouco ou nada poderiam ajudá-los em suas dúvidas.

E não foi difícil encontrar educadores que também sentiam em maior ou menor grau seus limites em relação à alfabetização digital.

Assim, fica absolutamente claro que se não cuidarmos de nossas desigualdades todas as outras camadas de dificuldades apenas se aprofundarão e irão compor uma verdadeira erosão social e cultural em nosso país em pouquíssimo tempo. A digitalização do mundo está sendo responsável, ao mesmo tempo em que oferece novas profissões e caminhos de subsistência, um grande exército de desocupados que simplesmente não conseguem assimilar este novo mundo.

O laço estreito entre analfabetismo digital e exclusão digital ocorre na medida em que parte considerável da população é alijada dos meios possíveis para gerar riqueza e conhecimento a partir destes meios digitais. Isso ficou muito patente durante a pandemia de Covid19 quando milhões de pessoas não tinham como realizar seus trabalhos remotamente, ou crianças que não tinham como ter suas aulas online.

Mas a exclusão digital possui outros tentáculos e por consequência outros alcances:
– é uma importante barreira a ser vencida para os que desejam produzir saber e conhecimento;
– acentua diferenças sociais
– dificulta acesso ao trabalho e por consequência melhoria nas condições de vida e renda;
– acentua o isolamento e a distância de territórios e pessoas (quanto mais distantes e pobres os territórios de exclusão digital aumentam)

Esta exclusão digital não possui um único tipo. Ela pode ser subdividida em:

  • exclusão de acesso
  • exclusão de uso
  • exclusão de qualidade no acesso

    O que este itens significam? Eventualmente as pessoas simplesmente não conseguem ter acesso ao meio digitais. Outros até podem possuir o acesso, mas não dominam de forma eficaz tais meios. E finalmente, há aqueles que possuem o acesso, conseguem usar algumas de suas possibilidade e ferramentas, mas não possuem conhecimento diversificado e aprofundado para tirar o máximo proveito de todos os recursos que estariam disponíveis.

    Ou seja, a exclusão digital é tão complexa quanto a exclusão social, mas possui uma série de variáveis que interferem em todo o processo e estes estão totalmente ligados aos meios digitais.

“Especificamente no caso do Brasil, a exclusão digital se assenta nas desigualdades sociais, culturais, econômicas e históricas.
Daí sua complexidade e acabar se transformando em reflexo de todas elas”.
E o principal: a exclusão digital e a exclusão social se retroalimentam reforçando uma à outra.

Por: eliana Rezende Bethancourt

Não enfrentar isso, significará ter um país cada vez mais empobrecido, famélico e sem possibilidades de exercer atividades que lhe ofereceram uma remuneração que mantenha a si e sua família.

É disso que teremos que tratar como cidadãos que ensinam e lutam por igualdade e cidadania digital e social .

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Trincheira das Palavras

Escrito e lido por: Eliana Rezende Bethancourt

Desafiam, instigam, maquiam… e, certamente provocam verdadeiras plásticas em sentidos, coisas, objetivos e relações.
Palavras que carregavam seu sentido e essência veem-se alteradas e/ou modificadas em uma forma de sequestro de significados, numa assepsia acéfala e às vezes, perversa .

A provocação aqui está em exatamente mostrar o quanto palavras foram extirpados dos nossos dicionários, e passaram a sofrer um processo de assepsia pela escrita e pela fala.
Termos, por exemplo, como velhice e morte passam a sofrer um processo de domesticação e afastamento como sendo algo abjeto, mesmo sendo parte de algo natural e que de fato fecha um ciclo do que integra a chamada existência. Em alguns casos, se transformam em termos tabus, considerados inapropriados à diferentes ocasiões.

Defendo o uso de tais palavras, livre de trincheiras, plásticas, maquiagens!

Por isso, em relação a estes termos como envelhecimento e morte quero tudo o que delas fazem parte. Se viver e envelhecer significar ter as marcas que o tempo me fez (quer na face, quer na alma), a experiência acumulada pela velhice dos meus anos e porque não dizer que quero a Boa Morte… no sentido da dignidade do encontro com um fim, porque não as usar?
Que eu possa ter a dignidade e naturalidade de viver isso tudo sem intermediários em seu momento final: tubos, máquinas ou mesmo palavras que roubem o sentido daquilo que de fato se vive.
Pois morrer e envelhecer são parte, negar isso é contradizer o que é natural.

Nossa sociedade está se habituando a mudar nomes como uma interferência asséptica, esquecendo-se que, envelhecer e morrer, possuem seus sentidos e significados, mudar as palavras não tira o sentido que eles têm.

Por isso, sou adepta de me chamarem como a vida assim quis. E se estiver velha, que me chamem de velha!

Talvez uma das formas que as usam para não enfrentar posicionamentos é exatamente nominar as coisas de outras formas. O enfrentamento não ocorre e as trincheiras das palavras servem apenas para dar sentidos outros ao que verdadeiramente se sente.

A sociedade que persegue a beleza das formas e a juventude infinita, se esquece de que o tempo é sinônimo do acúmulo e que para a maioria dos casos deveriam tornar as pessoas melhores, mais tolerantes e com uma capacidade de interação maior, sem agressividades ou desrespeitos.

Infelizmente o tempo não faz isso a todos e ferir pelas palavras passa a ser um meio subalterno de tentar chamar atenção para si. Donde chamar velho será xingamento. Forma amiudada de querer ser superior, pois mais jovem. Este recurso servirá apenas para pôr luz sobre as dificuldades de lidar consigo próprio e com o outro, nas relações pessoais, sociais, interpessoais e profissionais.

A velhice e a morte são faces da mesma moeda chamada vida e tê-las conosco é sinal de que entendemos o que todo um ciclo significou. É a moeda de troca que nos dá o simples direito de existir.

Certa vez um integrante de Grupo, o Professor Emicles Manguinho Filho, me disse algo lindo: que na Bahia (mais especificamente no interior), comunga-se com essa forma de pensar, porém, os poetas interioranos, na sua simplicidade, usam como sinônimo para o idoso do texto o termo “veiança“.
Achei absurdamente fantástico isso!
Longe de ser uma maquiagem que tenta trazer uma plástica de sentido, “veiança“,  ao contrário é uma bela palavra, em especial se tomarmos o seu sentido de produção cultural. Algumas palavras funcionam como roupagem e adorno para o sentido do que queremos transmitir.

Assim, “veiança” é uma delícia de fato!

Mas no mundo corporativo não é bem assim.

É comum o uso de palavras que chegam emprestadas de outras línguas, que camuflam e sofisticam fazeres sem conteúdo: a falácia da igualdade de programas de inclusão mal conduzidos, que acabam por segregar os diferentes; a responsabilidade social reduzida à uma ação assistencialista à comunidades, passando longe do ideal de desenvolvimento; o discurso da qualidade de vida no trabalho, enquanto se extrai sangue diretamente da jugular dos executivos, consultores e funcionários… são contradições que escancaram o que de fato se esconde atrás de trincheiras de palavras usadas apenas como camuflagem.

Nestes espaços, seus velhos são chamados de sêniors e rapidamente o mercado tenta substituir seus cabelos brancos por Júniors, recém chegados de seus MBAs. 
Velhos e jovens deveriam ser complementares, imprescindíveis uns aos outros na vida e nas organizações. E não vale dizer, por exemplo, que os velhos são a experiência enquanto os jovens trazem a inovação. Gerir capital Intelectual nas organizações fará com que haja simbiose e valor destas relações. Sem preconceitos.

Para este caso, estamos diante de fronteiras invisíveis criadas e tecidas nos espaços sociais, culturais e até profissionais. Os rótulos procuram enquadrar, segregar, e em vários casos, funcionam para manter ao longe o que é considerado indesejado ou inadequado aos objetivos de grupos, corporações ou indivíduos.
Numa cultura que se sustenta por consumo, substituição e juventude a qualquer preço, ser velho ganha o sentido de ultrapassado e passível de receber uma plástica de rótulos e funções.

Talvez por isso, ocorra a substituição do “sênior” por um “jovem talento” (palavras que tentam sanear espaços corporativos, dando-lhe um verniz feito de novos termos para velhos nomes, funções ou atribuições). Sênior e Júnior não podem ser tomados como antônimo um do outro! E cada dia mais Capital Intelectual é simplesmente posto fora do mercado de trabalho para ser substituído por “sangue novo”. Escrevi largamente sobre isso no artigo ‘Juniorização e perda de Capital Intelectual nas Organizações

Mas há muito mais.

A reflexão neste sentido é fundamental e nos deve fazer pensar. É fato que não mudamos uma sociedade inteira da noite para o dia, mas criar zonas de crítica e percepção é o mínimo que se deve esperar de profissionais atuantes e preocupados com a sua inserção, e a de outros.

Há também uma outra abordagem.

Há um componente que é a dimensão de autorrepresentação e de como as pessoas querem ser vistas.
As pessoas tendem a pôr ressalvas e não gostar que lhe chamem velho. Toma-se como uma forma menor de adjetivar, já que convivemos numa sociedade em que a tirania do sempre novo se impõe como necessidade de aceitação.
Isso de fato preocupa.

Vejo a necessidade de (re)significação no sentido de utilização de um termo que não merece “saneamento ou assepsia”, merecia ter seu sentido inicial. O que ocorre é que essa (re)significação deve partir do individuo, de se assumir como tal, em primeiríssimo lugar e, sem culpa ou desculpas utilizar socialmente o termo aos demais quando for o caso.
Mas sem dúvida, a escrita para consumo social coloca dia-a-dia o emprego das palavras, seus significados e apropriações culturais e sociais.
O escrito nunca é igual ao lido, e por ter a interpretação do outro pode gerar ruídos.

Me inquietam relações, sejam elas sociais, culturais, profissionais e até as midiáticas!
Para além do humano dou especial atenção a escrita e as muitas manifestações possíveis de comunicar pensamentos, ideias e as trocas, em especial as simbólicas: já que nossas moedas de troca e valor passam essencialmente pelo pensamento partilhado e compartilhado.

Por esta minha postura, já me disseram que isso seria conformismo: me render à velhice e à morte.
Mas não é conformismo. É simplesmente considerar que é parte de um grande ciclo. E que como tais merecem ter começo, meio e fim.

Não aceitá-las pode gerar em alguns certo amargor e isso não é bom nem para o individuo, nem para os que o cercam. Se tomarmos como parte, a velhice, passa a ser libertadora.
Aprendemos que somos os nossos melhores e mais presentes companheiros e que quando todos se forem, nós estaremos ali habitando nossa alma e povoando nossos mundos que existem por meio de nossos pensamentos.
Nos libertamos do compromisso de “o que você vai ser quando crescer?”. Nos libertamos da ansiedade de não saber o que resultará de nossas vidas, os amores que teremos, a vida que viveremos. Já fizemos e trilhamos o caminho da nossa história. Não há projeções inalcançáveis adiante. Haverá sim, possibilidades concretas a partir do autoconhecimento adquirido com a experiência dos anos. Não nos impomos tarefas que sabemos, não seremos capazes de realizar. E descobrimos que o maior de todos os luxos é o Tempo que temos para dedicar a nós e ao que aprendemos a gostar no decurso dos anos. As cifras não fazem sentido e o que fica de bom é tudo o que foi plenamente vivido, e não necessariamente o que nos foi remunerado.

É bom saber que o Tempo pode ser um grande aliado da vida que temos e da existência que partilhamos. E quiçá das rugas que teremos. Nesta linha de aceitação e compreensão que a vida nos marca e pinta da forma que ela quer, fiz comigo mesma o exercício de assumir os tons que a vida me pintou. E assim ganhei nos primeiros meses de 2021 em período pandêmico os tons prateados que contam um pouco da história construída e vivida até aqui. É a escrita do Tempo deixando seus traços no meu corpo: é a Escrita do Tempo sem trincheiras, máscaras ou disfarces.

A antropóloga Miriam Goldemberg, em suas pesquisas sobre o comportamento humano, colheu que o mais importante seria a qualidade das rugas e não a sua quantidade. Disse ela que o riso e o sorriso continuado, provoca rugas, porém, rugas com orientação para cima; diferentes das rugas convencionais.

Acho que só se pode brincar assim os que tem assumidos os seus anos! Aqueles que têm lá suas dificuldades tentam maquiar, “botocar”…esconder… Quem já não viu a exposição que chega a ser patética de pessoas que querem ter uma idade que não têm: pintam o cabelo, os cortam como quando tinham 20 anos, ou pior: usam as roupas desse tempo e ainda insistem com a sessão juvenil das lojas de departamento!?
Saber rir das próprias limitações é também se ver como velho, mas nem por isso como algo a ser descartado sem importância! Se dê valor e se respeite não como algo a ser descartado, mas como alguém pleno, inteiro, que basta a si próprio e que parou de estar preocupado com o que os outros pensam sobre você. Lembre-se que todas a vidas que viveu estão lá, no fundo dos teus olhos e podem ser alcançados com as memórias que te pertencem e que foram guardadas para tais momentos.

Uma vez me disseram algo que só agora entendo: “Eliana, minha cabeça pensa como quando eu tinha 20 anos… meu corpo é que tem 70!”. Inúmeras vezes me olho no espelho e me lembro exatamente do que eu pensava aos 5 anos de idade, quando minha altura só permitia que eu visse meus olhos refletidos no espelho da cômoda do quarto da minha mãe. Acho que a mente não envelhece… o corpo é que não entende bem e segue acumulando os anos!

Mas se assim é, porque então mudar seus nomes? Usemos as palavras para significar o que precisam significar. Não as usemos como trincheiras para esconder ou maquiar.

Afinal, quem precisa de plástica para as palavras?

*Adento Pós-Pandemia

Quando este post foi escrito em sua primeira versão a pandemia por COVID19 era apenas uma ficção científica.
Lido no contexto de pós pandemia o texto precisa ser redimensionado.
A morte nos chegou de forma abrupta e retirou de muitos o direito ao que chamei acima de “Boa Morte” (aquela que ocorre de forma a respeitar a naturalidade deste acontecimento). Muitos a encontram sem os intermediários necessários (medicamentos, respiradores) e não tiveram escolha ou qualquer possibilidade de paz no momento de partir. Famílias destroçadas não puderam fazer uma despedida como seria de se esperar e os lutos se arrastam em intermináveis dores.
Por isso, é preciso compreender o texto acima num contexto de normalidade e escolhas. Algo muito diferente de um momento pandêmico onde a morte chega breve, abrupta, sem escolhas e não como parte de um ciclo natural.

* *Post atualizado de publicação feita originalmente no meu Blog, o Pensados a Tinta.
Se desejar Ouça eu ler para você (escolha a opção abrir com: Music Player for Google Drive) da versão original.

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Arquitetura tumular: a cidade dos mortos no mundo dos vivos

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Arquitetura tumular: a cidade dos mortos no mundo dos vivos

Por: Eliana Rezende Bethancourt

Há muitas formas de visitar a morte.
Às vezes, a visitamos pela experiência sofrida assistindo a debilidade que avança, os dias que chegam ou o convívio com uma sentença de morte provocada por uma doença sem cura, ou um acidente que ceifa vidas e planos.
A experiência sentida para todos estes casos é a da perda ou dor. Paira sobre nossas mentes e nos faz saber que, mesmo em sua ausência, sua presença pode ser constante enquanto não chegar.
Seu lugar em nossas vidas está também nos espaços que ocupa. Espaços simbólicos, emocionais ou físicos, não importam. Os tempos e espaços destinados para a morte em nossas vidas ocupam nossos corpos, mentes e até mesmo lugares específicos para seu culto/lembrança.

Dentre os lugares de morte o cemitério talvez seja o de maior representatividade no mundo. E aqui, independente de culturas ocidentais ou orientais é um espaço do Sagrado e de reverência ao que ele guarda. 

Os cemitérios são exatamente o local, e a cidade dos mortos, no mundo dos vivos. 
Representam esta cidade que está calada e desenhada, porém viva como um recado, uma lembrança, um alerta. É arquitetura esquadrinhada, que possui seus lugares e hierarquias e até mesmo imposição de posições sociais, prestígio, status e valores que podem ser observados através de todo um conjunto de símbolos que chamamos de arquitetura tumular. Exemplos não faltam de elementos desta arquitetura de vivos para o mundos dos mortos, e neste ponto apresento alguns destes elementos que utilizamos como estudo na área que denominamos em História de Cultura Material.
Os jazigos, seus túmulos e toda a referência mobiliária e de objetos prestam-se a um excelente meio de análise e abordagem de um tempo: oferecem ao pesquisador referências interessantíssimas e muitas vezes ausentes em outros tipos de fontes como: nomes, datas de nascimento e morte, preferências sociais, culturais e relações familiares trazidas por meio de dedicatórias e despedidas onde os nomes e laços de parentescos ficam expostos.
Convertem-se em acervos “vivos” da Memória de um tempo e das vidas de seus ocupantes, os seus laços e suas relações.

Há todo um conjunto de signos iconológicos que favorecem a interpretação sobre o período de sua produção e em qual contexto social e cultural foi utilizado como representação. Em tempos mais recentes as fotografias surgem como outro elemento carregando mais informações sobre o morto. Sua fisionomia, e em alguns casos, sua sisudez ou sorriso nos desafiam o olhar. Fixados num determinado espaço/tempo nos dirigem o olhar,  nos inquirem… Recortados em um contexto são imagem cristalizada de um projeto que se interrompeu. A imagem, por excluir a morte, é carregada de vida e energia. Talvez por isso, tenhamos a empatia do olhar que se comunica e troca. É impossível não pensar sobre aquele rosto, a história que tinha e como chegou ali: alguns muito cedo, outros após uma existência plena com cônjuges, filhos, netos e até bisnetos.
Englobam-se no que chamamos arquitetura tumular a arte representada pelas esculturas que ornamentam os túmulos. Representam visões de mundo de um tempo, de uma sociedade, de grupos familiares e pessoas, fornecem elementos caros à construção de uma memória de si e do seu entorno social. Um conjunto rico, e muitas vezes valiosíssimo de expressão artística, fazendo muitos cemitérios ter programas de visitas guiadas por seus túmulos para amantes desta arte ou para acadêmicos de diferentes áreas.

Muito interessante entender que os cemitérios, tal como as cidades tem uma história de implantação e definição tanto estética quanto dos seu lugares e limites no tecido urbano. Não surgem espontaneamente, e são sim fruto de um projeto social para estar inserido no mundo dos vivos.

Por isso, é preciso entender as circunstância em que os cemitérios foram se secularizando. O espaço destinado aos mortos era sempre um local de proximidade: eram colocados, por exemplo, nos terrenos em volta das casas, ou nos espaços considerados sagrados das igrejas e seu entorno. Isso propiciava a proximidade e alguma privacidade a estes corpos abandonados pela vida, ceifados por diferentes motivos. A secularização dos cemitérios levou estes corpos a compor um outro espaço só que desta feita coletivo. Os mortos seguem assim um destino comum reservado a todos e longe das casas e seus quintais que os abrigaram por toda vida. Neste local, o espaço da morte é definido e demarcado para estar nas bordas das cidades e a partir de uma concepção higienista de sociedade, onde a doença e a morte precisam ser isoladas e retiradas do convívio familiar. Experimentar a doença e morte deixa de ser um ato corriqueiro e familiar (algo que até então era usual e costumeiro) e começa a possuir espaços definidos para isolar, cuidar e quando não for mais possível, enterrar. A doença, a dor e a morte eram assim levadas para outros territórios. São territórios da morte.

Os túmulos de uma mulher católica e seu marido protestante, que não puderam ser enterrados juntos devido aos regulamentos do cemitério. Eles morreram na década de 1880.
Nota: as mãos segurando sobre a parede divisória. Localizada em Roermond, Holanda.
Por: Lindsey Fitzharris

Uma cidade aprisionada
A sociedade deste período (e falamos em algo a partir do século XVII e XVIII, com maior incidência a partir do século XIX) passa a ter diferentes instituições que procuravam isolar, controlar e disciplinar. É deste período que vemos o surgimentos de instituições como quartéis, conventos, escolas, manicômios, hospitais e porque não cemitérios?! A lógica para todos os casos é sempre a mesma: murar, cercar e facilitar a vigilância fornecendo espaços esquadrinhados, milimetricamente individualizados, entradas e saídas quase que exclusivas e horários rígidos para trânsito e permanência. A individualidade garantida é a do próprio corpo que ocupa celas, cadeiras, camas ou para nosso caso, o jazigo, a sepultura.

Para os cemitérios, a ordem de fechamento, que se mantém até os dias de hoje, revela a nítida separação entre o simbólico: Luz e Sombras, que remete ao perigo das almas que habitam o “mundo subterrâneo e escondido das profundezas”. Não devendo por isso, comunicar-se com o mundo dos vivos no período onde reinam as Trevas.

Esta cidade dos mortos a que nos referimos acima recebe dos vivos, em seus primeiros séculos, consideráveis investimentos: a morte e os sentimentos em relação a ela precisavam ser mostrados por meio de mausoléus ricos em detalhes, com muitos acessórios e peças vindas da Europa. Artistas, escultores e artífices da morte eram contratados para entalhar detalhes de vida e personalidade do morto em pedras, mármores, granitos. materiais que pela dureza e durabilidade remetiam à Eternidade, Permanência, Presença do Ausente.

À medida que a sociedade sofre a perda do poder aquisitivo, os túmulos deixam de ser locais de ostentação e a arquitetura tumular parece empobrecer. É o período de popularização de cruzes, sem a riqueza escatológica de períodos anteriores. A cor predominante continuava sendo o branco. Mas o investimento na morte se reduz enormemente.

Em períodos de maior opulência, como entre os anos 1900 e 1930 no Brasil, a morte passa a ser vista como um grande espetáculo e momento onde se pode mostrar a força e o poder.

Com isso toda uma produção artística atende esta população endinheirada e opulenta das cidades que se metropolizam. As cruzes passam a ser paulatinamente substituídas por crucifixos.
Tal como a cidade extra-muros, não há homogeneidade entre seus ocupantes. Riqueza e poder possuem elementos explícitos de ostentação. Daí a riqueza que estes elementos oferecem como território de análise para construções mentais, sociais e culturais. É um território de representações, sem dúvida! Mas tais construções iam além: os cemitérios podiam segregar não apenas por seu mobiliário e posição social. Desde o passado remoto, os mortos poderiam ser incluídos ou excluídos a partir de seus dotes ou preferências espirituais. Quanto mais considerados próximos da Divindade mais próximos poderiam ser enterrados dos templos e locais de adoração. Em tempos mais recentes os cemitérios criaram a segregação religiosa. E assim protestantes não podiam ser enterrados em cemitérios cristãos, suicidas não podiam ser enterrados em solo cristão, nem mulçumanos em cemitérios não-mulçumanos e assim sucessivamente. A morte e seus corpos carregavam o estigma espiritual de suas opções e escolhas feitas em vida. 

Ter em mente todos os elementos citados acima não significa esquecer-se de outras dimensões.
Passear por suas Alamedas propicia um silêncio e um contato com o tempo de histórias que já se foram, personagens petrificados em sorrisos de fotografias, em frases nas placas com datas, locais de nascimento, dedicatórias, epitáfios ou mesmo frases avulsas que sintetizam  pensamentos e ideias dos que foram ou dos que ficam. A comunicação entre vivos com seus mortos e dos mortos por meio de seus epitáfios são gravados em pedras e materiais de longa resistência como mármores, granitos. São assim um convite à permanência e resistência ao tempo e intempéries. Afinal ali estarão, imóveis… colocadas para resistir às muitas estações e gerações. Só farão sentido se assim forem e se assim conseguirem se manter frente à passagem do tempo por elas.

Estes escritos são, portanto, o registro do Tempo. São um mergulho de alma que nos remete a vidas que se passaram e relações que se entrelaçaram. Vínculos expostos publicamente num gesto final que pretende ser de resistência ao esquecimento.  Este território da morte perdido na cidade dos vivos é um território de transição: local de saudades de lembranças, abandonos, vidas que se deixam, vidas que permanecem.  Esta transitoriedade presente e calada nos faz pensar sobre permanência e imanência, e mostram a relação que seres humanos possuem entre si e com a sua representação de seus medos, suas inseguranças, esperanças e até fé.
Inevitável não pensar em alguns casos como o abandono chega e avança: delapidação, vandalismo, esquecimento, estão presentes em muitos destes locais.

Em outros lugares, ao contrário, somos levados a observar o cuidado com a lembrança personificada pela presença viva de flores e plantas. Afinal, estas servem para nos fazer lembrar que a vida possui seus ritmos, obedecem estações e estão em meio a esse tempo passado.

Os cemitérios, tanto como as cidades, envelhecem e até morrem. Deixam de ser territórios de lembrança, culto e devoção. Vencidos pelo tempo, muitos apenas deixam de existir. Outros, tal como muitas cidades ganham robustez com a passagem do tempo por meio dos personagens que ali tem seu destino final. Oferecem a todos o testemunho de um outro tempo e seguem sendo uma cidade de mortos no mundo dos vivos.
Paradoxal portanto, que este mergulho nesta cidade dos mortos, revela o quanto de vida pulsante existe em suas ruelas, quadras, muros e extra-muros. 

Os Mortos e o Luto em Tempos de Pandemia

Não poderia deixar de abordar o tratamento dado a morte e seus corpos em tempos de pandemia. 

A Pandemia de COVID19 trouxe ao mundo uma outra relação com todos os ritos relacionados aos mortos e seus parentes: desde os processos de isolamento no período crítico de internação, até sepultamentos sem velórios acompanhado por apenas uma ou duas pessoas. A experiência do luto deixa de ser restrito a um grupo familiar e ser compartilhado por cidades, países, continentes. A vivência da doença e morte é levada ao paciente como experiência solitária. A morte e sua materialização ocorrem em valas comuns ou sepulturas que se espalham pelos cemitérios aguardando caminhões frigoríficos e filas intermináveis de carros funerários. A morte ganha um status de linha de produção com excedentes de corpos insepultos.  Os corpos perdem o direito dos seus ritos: procedimentos de tanatopraxia (lavagem e preparo do corpo para o rito fúnebre) por exemplo, deixam de ser feitos. Os corpos possuem terão que passar por procedimentos de limpeza com produtos adequados, são embalados em plásticos com zíper e entregues para sepultamento em um caixão lacrado. Sem velórios, os corpos seguem para o sepultamento ou cremação acompanhados por no máximo quatro pessoas.
As despedidas comuns aos entes queridos deixam de ser possíveis, e em muito casos a pessoa que entra no hospital para isolamento nunca mais retornará. 

O Brasil, apesar de todo o negacionismo em relação às mortes, teve cemitérios lotados, covas rasas, retroescavadeiras, caminhões frigoríficos e até valas comuns! Tudo revelando a forma como a doença inesperada escancarou despreparos, desrespeitos e alguma negligência por parte de autoridades. Afinal, a cidade dos mortos pobres nas cidades dos vivos, significa invisibilidade constante. Os cemitérios apenas existem nas áreas periféricas para dar destino aos corpos que abandonam a vida por doenças e mortes violentas. Não cumprem uma função social de conforto, mas mais uma vez de exclusão e silêncio.  

Exemplar destas cenas são rapidamente localizadas, mas creio que dois cemitérios representaram muito bem o que foi a invasão de um inimigo oculto na vida das cidades. O cemitério de Manaus nos ofereceu cenas que serão icônicas do que significa improvisação e um estado acéfalo: valas comuns e retroescavadeiras.

Outro exemplo as imagens aérea do maior cemitério de São Paulo (Vila Formosa) com covas abertas antecipadamente aguardando seus mortos, que chegavam em filas de carros fúnebres. 
Sem ritos, túmulos ou cerimônias e despedidas, as cruzes brancas com números identificam os mortos em valas estreitas e rasas. Uma explosão demográfica na cidade dos mortos: crescimento desordenado, sem planejamento, vias de acesso ou quadras…

O espaço, que em uma configuração planejada seria de uma determinada dimensão tem as sepulturas delimitadas por madeiras para separar o espaço mínimo entre os corpos e sua urna. Tal a quantidade de corpos perfilados.  

O tempo ainda nos mostrará com maior amplitude as cicatrizes nos tecidos destes solos, sagrados para alguns, e suas consequências na forma de entender este processo de mortes coletivas e a lida com o luto. De concreto temos é um novo espaço criado pela pandemia nas áreas periféricas de todas as cidades: um espaço que não mais apresenta uma arquitetura tumular, mas simplesmente caminhos perfilados de caixões, justapostos lado-a-lado. 

A desigualdade se manterá entre ricos e pobres, já que para o caso dos endinheirados seus corpos serão depositados em seus mausoléus e túmulos de família. A escrita da pandemia nos cemitérios da cidade deixará seu desenho de exclusão e indiferença muito bem marcados. 
Não concluo, pois há uma pandemia em ação. Os corpos que deixa atrás de si contam trechos de muitas histórias. 

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Artigos relacionados:
Rezende, Eliana Almeida de Souza.  “Os historiadores e suas fontes em tempos de Web 2.0“. Publicado nos Cadernos do CEOM, ‘Documentos: da produção à historicidade”, Capa > v. 25, n. 36, Editora Argos, Chapecó, 20 (acessado em 01/11/2020)
Rezende, Eliana Almeida de Souza. “Ventres urbanos: cidades e sanitarismo“. Revista Ler História. Dossiê Guerras Civis, Lisboa. n. 51, 2006. pp 135-165 (acessado em 01/11/2020).
Rezende, Eliana Almeida de Souza. “Construindo imagens, fazendo clichês: fotógrafos pela cidade” (acessado em 01/11/2020)

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Pelas Janelas do Confinamento

Por: Eliana Rezende Bethancourt

Sempre gostei de pensar sobre como uma fotografia funciona a partir do enquadramento que o fotógrafo nos oferece. O fotógrafo hábil é aquele que consegue recortar e enfocar partes que deseja destacar ou omitir. O enquadramento revela ao mesmo tempo que esconde. No recorte dado pelo fotógrafo há o que se quer mostrar, e todo o resto compõe o que chamamos extra-quadro. Tudo o que não interessa ao olhar fotográfico é simplesmente silenciado pela ausência imagética. A forma de enquadramento e enfoque trará ao observador a sensação de que não falta absolutamente nada. Tudo está ali.

A mesma lógica pode ser usada a partir dos enquadramentos de nossas existências: o que pomos em relevo e o que simplesmente omitimos ou escondemos.

O mundo que nos cerca é um palco cenográfico, onde cenas são justapostas e ganham alguma relevância, enquanto outras ganham sombras e desimportância.

O período de isolamento social conseguiu oferecer a cada um de nós um ponto referencial de observância do mundo e de expressão por ela: nosso olhar, nossas janelas, varandas, portões.

De forma especial e totalmente inesperada, dada às convulsões sociais pelas quais passamos, nossas janelas transformaram-se em camarotes, ora para simplesmente observar, ora para aplaudir e se manifestar. Historicamente, estes espaços de vida privada não tinham comunicação direta com a rua, mas eram sempre vistas como forma de uma vista indireta e contemplativa. Lá fora a rua estava distante e a janela oferecia a possibilidade da vista privilegiada do interior para o exterior, mas não o contrário disso. A solidão contemplativa era garantida por vidraças, venezianas, cortinas. Todo um aparato para velar, esconder. Do outro lado da rua apenas um quadro pendurado na arquitetura velado por cores de um tecido feito para ser cortina e barreira.

Crédito: Lionel C. Bethancourt

A experiência do isolamento social estendeu uma pausa imensa em vidas, planos, existências. Esperar…esperar… passou a ser o empreendimento de todos. A mobilidade quase infinita, deslocamentos rápidos, migrações simplesmente foram freados. Emparedados, enquadrados e fechados… eis no que o mundo teve que se converter. O confinamento se colocou como questão de sobrevivência, e com isso imperou sobre nossas vontades.

Mas nem tudo precisava ser contido. Novos meios foram encontrados para resignificar nossas existências, descontentamentos, frustrações, bem como momentos de contentamento, alegria, gratidão.

Sob esta ótica que neste período de isolamento as janelas e varandas converteram-se em espaço de troca. Uma nova estética se pôs, o mundo do interior de nossas casas revelou-se. Houve aplausos, músicas tocadas ou cantadas, buzinaços, ‘panelaços’ e até projeções de imagens, protestos e palavras de ordem, irreverências e muito ativismo. As janelas ofereciam com isso, o espetáculo da presença, da vida, do brinde, da resistência, presença das ausências…da procura do Outro em todas às suas formas ou solidariedades de objetivos ou ameaças comuns. Eram coletivos na expressão geral, mas ao mesmo tempo anônimos em nossas individualidades. As interações nos davam uma identidade através de pautas e solidariedades comuns.

As trocas simbólicas decorrentes da impossibilidade dos contatos físicos surgiam de forma espontânea e quase viral. As janelas, convertidas em abertura para o mundo e não mais como uma tela, um quadro, um enquadramento para ver ou se esconder contemplativamente. Tornaram-se um espaço para o encontro, para a troca, para a conexão num mundo onde a conexão virtual não basta às emoções, onde as trocas podem ser feitas de formas mais intensas e interativas. A criatividade encontrou muitas formas de manifestação: foram brindes, cantos, palmas, cores, apresentações musicais várias. A janela abria-se para o mundo e convertia-se em passagem/exposição. É estranho pensar nisso, já que parecia ser ponto pacífico que as pessoas estavam muito satisfeitas com suas redes sociais e contatos virtuais. Mas a ausência das ruas e seus espaços sociais de trocas e vivência mostraram o quanto ainda precisamos de tudo isso.

O mesmo se dá com a ocupação do espaço urbano/social: as projeções tão em voga, em especial na cidade de São Paulo revelavam isso de forma fantástica: imagens se projetavam de forma gigante em outros prédios que também se manifestavam. Uma estética diversa de resistência, ocupação e projeção digital e real no Outro os seus desejos e frustrações. O espaço social ganhava outra dimensão a partir do enquadramento/exposição nas janelas e varandas das cidades. A projeção encontrava na arquitetura bruta de fachadas e concreto a tela perfeita para funcionar como retrato e exposição. Sem circundar ou limitar a aparição a imagem extrapolava os limites construtivos e podia espalhar-se por outros prédios. Um diálogo interessantíssimo de desejos, vontades, protestos e “gritos” de silêncio povoado apenas pelas imagens. A imagem neste sentido era única, mas as vozes que a acompanhavam eram coletivas, deixavam de ser o indivíduo para ser o condomínio, o bairro, a cidade…o país.

Daí o sentido de ocupação do espaço urbano como campo de lutas e resistência. De reivindicações e protestos, de solidariedades…

Mas e aquela tão presente e às vezes inacessível “janelas da alma?”. Creio que aqui foi o ponto onde muitos definitivamente tiveram muitos problemas com o isolamento social. O confinamento levou muitos a ter que recolher-se para seu interior e ver o que habitava em suas janelas interiores. O contato com esta alma habitante, para alguns, foi carregada de percalços: conviver com o universo interior pode ser muito difícil. Longe das vozes externas que nos tiram a concentração e distraem, as vozes da alma podem ser muito ruidosas. Tão ruidosas que simplesmente não se consegue calá-las. A experiência da solitude para alguns é praticamente impossível.

A solitude é aquela experiência de estar consigo mesmo, mas preenchido, não há a sensação de estarmos sós. O pensamento é companheiro e o quê os olhos veem e o corpo que sente são os alimentos desta alma. São interlocutores e incentivadores da profunda existência interior. Para estes, a experiência deste silêncio interior é bem vindo e o período de isolamento social favoreceu experiência agradáveis de estar consigo mesmo. Para outros, foi a sensação de aprisionamento solitário, melancólico e até depressivo que imperou.

Como vizinhos de janelas geminadas, a alma pode muito bem relacionar-se com os de dentro e os de fora, dependendo de como prioriza e sente todos os estímulos que lhe chegam. A janela que abre para o interior também é uma perspectiva, um enquadramento de sua atitude perante a vida. Ao fazer isso, como o fotógrafo enquadramos e enfocamos o que para nós é importante, e simplesmente omitimos ou desconsideramos o extra-quadro. Não acho que se precisa viver uma mentira. Basta apenas entendermos que nossas perspectivas tem contextos e se inscrevem dentro dele. Pôr em evidência alguns aspectos não significa que tudo o que está no extra-quadro não existe. Quando mudarmos o olhar tudo estará lá. Por isso é bom conhecer e conviver com todas as nossas mobílias interiores.

Provavelmente isso não se manterá, e muito em breve retornaremos aos nossos medos, inseguranças, trancas, vidraças, cortinas, telas de proteção. Mas teremos experimentado, ainda que brevemente, uma forma de relação interativa com uma sociedade inteira a partir não de uma tela de computador, mas de uma janela que se abre e deixa entrar.

Como podemos ajudar?
Na ER Consultoria possuímos metodologia própria, conhecimentos testados e experiência prática para auxiliá-lo com as melhore práticas.
Se você possui um acervo que seja Patrimônio Cultural/Documental e não sabe como zelar por ele ou torná-lo ferramenta metodológica para ministrar conteúdos interdisciplinarmente entre em contato com a ER Consultoria. Teremos enorme prazer em pensar numa Solução customizada para as suas demandas, ou para o tratamento técnico documental de acervos documentais e fotográficos e sua preservação e conservação, além de sugerir caminhos para a produção de conteúdos didáticos interdisciplinares.
Outro aspecto que podemos ajudar são os relacionados à Projetos de Memória Institucional e suas relações com as cidades.

Veja nosso Portfólio de Cases e o que nossos clientes tem a dizer.

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EaD não é improviso! É Ferramenta.

Por: Eliana Rezende Bethancourt

A chegada do Covid19 nas existências de milhões de pessoas quase que simultaneamente, descortinou um horizonte distópico, presente apenas em ficções científicas.

Sem qualquer cerimônia ritmos de vidas, trabalhos, existências, planos simplesmente tiveram que ser interrompidos, adiados, e em alguns casos perdidos para sempre.

A Educação acabou sendo uma das áreas mais afetadas, por atingir diferentes faixas etárias e de níveis de aprendizagem que diariamente passam por ela.

E a Escola, de repente, como que num tranco, teve que digitalizar-se.

A aventura da digitalização em ambientes escolares encontra muitos e variados problemas, que por décadas, não foram tratados ou mesmo considerados. Por anos adiou-se a inciativa, considerando-se sempre que o futuro seria um bom lugar.

No entanto, e em virtude desta digitalização por trancos, assistimos a um processo de oferecer tal digitalização do ensino como panaceia de baixo custo e solução rápida para o enfrentamento do isolamento social. Era uma suposta solução, mas que resultava ser quase que de improviso, já que até então NUNCA tinha sido tomada como realidade para o ensino, em especial para os anos de formação dos alunos. Mesmo nos casos de Ensino Superior, o EaD era feito com várias ressalvas e em casos bem específicos. NUNCA como dinâmica para aulas.

Diante de tal quadro de improvisação generalizada os resultados não tem sido bons, e os motivos podem ser desfiados em um grande rosário. Poderia elencar uma infinidade deles, mas detenho em apenas alguns.

Vejamos:

1) Uma das maiores lendas sobre o EaD e processo de ensino digital ou virtual é de que ele seja barato e rápido. Bastaria um computador, um celular, uma plataforma qualquer e pronto! Mágica se daria. Vídeos poderiam ser mostrados e as aulas seriam uma festa.

A realidade é outra, muito diversa. EaD não é improviso! Não pode ser pensado como um remendo para um buraco curricular onde o ensino presencial não possa ocorrer. Até o nome parece indevido, já que o Ensino não pretende pôr os alunos à distância. Ao contrário, o maior esforço desta modalidade é dar ao aluno a sensação de proximidade ainda maior com seu professor do que em aulas presenciais.

2) Para alcançar seus objetivos PRECISA ser estruturado e pensado para seu público alvo. Necessita de  objetivos muito claros e sequências de dificuldades que incorporem e validem se a aprendizagem está ou não ocorrendo. Isto deve ser feito antecipadamente, e por isso, sua matéria-prima mais importante é o Tempo. Precisa passar por diferentes fases que vão desde a elaboração, produção, a validação e disponibilização. É um trabalho multidisciplinar que dá ao conteúdo extensão e profundidade que garantam interesse e possibilidades de aprendizagem. É neste caminho de construção que se estabelecerão as possibilidades de estreitamento de relação entre docente, discente e conteúdos propostos.

A lógica construtiva é de favorecer a aprendizagem por camadas de dificuldades e etapas, ao mesmo tempo em que individualidades se beneficiem disso, já que o estudo é individual.

Este meio de produção é interdisciplinar por que vai desde a definição e elaboração do conteúdo que o docente quer abordar a partir de um planejamento, e posteriormente, o desenho deste adequando-o ao ambiente a ser usado. Entram neste momento profissionais que trabalham com a redação, ilustração, animação destes conteúdos. Como tijolos de uma construção, vão sendo sobrepostos e encaixados para um fim último, previsto na fase de planejamento.

3) Os recursos vão muito além de plataforma digital obtida através de um aplicativo de celular ou do uso de vídeos gravados no YouTube.

Ou seja, EaD não é panaceia para nada e muito menos custa “barato”.

Infelizmente, como sempre acontece com áreas de tecnologia, há mascates que tentam vender uma fantasia que não se realiza.
EaD é APENAS FERRAMENTA!
A produção, altamente especializada fica com os alimentadores (que neste caso são os docentes e a equipe multidisciplinar citada acima). Não são mérito o produto de prateleira oferecido em uma ferramenta. Por isso, não estão no âmbito de uma Solução. Esta só pode ser oferecida pelos que sabem o que desejam, como e para quem se destina. Em outro artigo explicito a diferença entre Ferramenta e Solução, que você pode ler aqui.

5) E aí seguimos para o outro universo bastante real.
Tais plataformas necessitam de uma velocidade de internet e de trânsito de dados (no caso de celulares) relativamente grande para o quê a maioria esmagadora da sociedade não têm acesso. Muitos dos alunos não possuem sequer celular ou computadores pessoais com redes que ofereçam esta quantidade de tráfego de dados.

Do ponto de vista de tecnologia e acessibilidade somente uma minoria poderá ter acesso a este meio de ensino.

Mas as dificuldades não param na tecnologia.

Além do espaço virtual, temos uma dificuldade de espaço físico. Nossa sociedade chega a ser miserável, e imaginar que alunos conseguirão ter espaços apropriados para estudar e aprender é outra ficção. Muitos não possuem nem uma cama para chamar de sua! Dividem muitas vezes esta cama com outros irmãos, e esta é disposta em um quarto com outras “camas”, onde a família toda fica. Algumas vezes, este cômodo também é cozinha e/ou a sala. A conformação do espaço físico onde estes alunos estão, somados à inviabilização tecnológica se coloca como um muro para as necessidades de aprendizagem. Um obstáculo, muitas vezes intransponíveis.
E do ponto de vista de apoio intelectual ou mesmo o esclarecimento de dúvidas, quase quem na maioria dos casos não possuem pai ou mãe, ou alguém mais velho em condições de lhe ajudarem nas dúvidas mais simples. Temos um país onde o analfabetismo funcional e tecnológico impera. São tantas as mazelas!

6) Aí chegamos à outra ponta das necessidades: o capital intelectual produtor dos conteúdos: os professores das redes de ensino.

Uma reportagem recente mostrou que 8 em cada 10 professores se sentem incapazes de produzir e administrar os conteúdos on-line para suas diferentes turmas e séries. Vários deles, e quase que sem alternativa, usam Whatsapp para desenvolver seus conteúdos. O que representa de fato uma improvisação sem tamanho.

A formação de nossos professores é muito restrita em alguns casos, e isso faz com que tenham limitações profundas em introduzir seus conteúdos de forma diversificada e longe das salas de aula. Fazer a ponte entre conteúdos teóricos para questões práticas de aplicação tornam-se quase inviáveis para alguns docentes. às vezes por restrição intelectual, às vezes por inabilidades ou fragilidades didáticas.

Tudo estaria bem, mas ainda temos OUTRO sério e grande problema:

Nossos alunos, e dada a fraca formação que acabam por receber, estão longe do que seja saber estudar por si. O ensino EaD pode ser desafiador, e afirmo categoricamente que se beneficiarão dele os que souberem estudar, já que esta forma de ensino exige muita dedicação, concentração e disciplina. Em geral, os melhores alunos e mais dedicados são os que mais se beneficiam. Mas aqueles alunos com maiores limitações e dificuldades ficarão ainda mais longe dos objetivos propostos.

Ou seja, todo este processo de digitalização do ensino é interessantíssimo, mas muitas bases precisam ser previamente lançadas. Não há espaço para improvisos. EaD não pode ser olhado como o tapa buraco ideal num momento de pandemia.

É preciso sim, compreender que o EaD possui possibilidades e muitas limitações. E só a partir de um desenho cuidadoso que se pode optar por ele sem ser apenas um mascateador de educação. Ninguém deseja isso.

Mas então como fazer?

Em primeiro lugar, não creio que sejam as ferramentas disponíveis que darão respostas tão importantes e necessárias para nossas demandas. É preciso desmitificar o EaD como panaceia. A rigor, o elemento fundamental e mais importante na relação ensino-aprendizagem é a relação entre docentes e discentes e a forma como pontes são criadas para dar acesso à produção de conhecimento.

A dinâmica do ensino que temos nos dias de hoje ainda está presa às tradições positivistas do século XIX e começo do XX. Na maior parte das vezes, o ensino é conteudístico e os alunos colocados como receptáculos. É um sistema fabril, onde as individualidades e capacidades individuais não são tomadas em conta, onde o conteúdo é homogeneizado para consumo horizontal de muitos.

A digitalização de estratos da sociedade e a forma como as redes sociais invadiram todos os espaços alterou capacidades de concentração e interesses. De um lado nossos alunos estão viciados em estímulos rápidos e não conseguem concentrar-se por tempo suficiente para “criar” algo. No geral, os alunos delegam a ferramentas como Google e demais aplicativos, tarefas que exigiriam tempo e construção. E está aí, o calcanhar de Aquiles que os professores poderiam mudar todo o jogo do tabuleiro. Ao ensinar seus alunos a aprender e produzir, estariam libertando-se da tarefa monótona de “ensinar”. Em verdade, caberia a si a tarefa de ser um incentivador, um estimulador de trilhas para descobrir porquês. Aqui sim, acredito que a mágica se faça. E para tanto, não são as ferramentas que fazem isso. Num mundo onde onde inteligências artificiais estão em discussão, o verdadeiro “valor” não é o que máquinas são capazes de fornecer, mas sim àquilo de que precisam e só os humanos são capazes de fazer: desenvolver experiência para adquirir sabedoria.

Se o caminho é de descobertas, deve haver por parte de quem estimula isso o apreço pelo improviso, pela flexibilidade e mudanças de rumo. Portanto, o segundo passo fundamental é não exigir de si ou dos alunos mais do que todos são capazes de construir. Portanto, limite-se ao básico. Não expanda demais seus horizontes para ficar parado em lugar algum. Concentre-se com foco num ponto onde todos serão capazes de chegar e a partir dali, se for possível, seguir adiante. Neste momento é importante não sofrer da “síndrome de Deus”. Não queira fazer tudo ao mesmo tempo. Lide com suas próprias limitações, as de seus alunos e da sua instituição. Reconheça as diferenças entre todos. Aqui é uma trilha para uma montanha e cada um carrega mochilas com suprimentos diferentes, com pesos diferentes e com habilidades diferentes. Portanto, deve-se buscar um horizonte comum a todos.

Neste primeiro momento é preciso encontrar-se esta ambientação e troca.  Se ao término tiverem aprendido como realizar isso já terá sido um grande começo.

Entenda, que aqui o maior valor de todos é a capacidade criativa e colaborativa. Há que se admitir e entender que as disciplinas são comunicantes entre si. Saber fazer esta costura fina entre as partes diminuirá a carga e o volume de trabalho. Uma mesma tarefa bem construída poderá ser pensada por várias áreas e a forma de construção em projetos fica extremamente facilitada aqui.

Torne os alunos parte do processo e quem sabe, envolva-os ao ponto de eles próprios criarem conteúdos para os mais novos. Ou mesmo buscarem forma de compartilhar suas descoberta através de infinitas formas de publicação: de papel pardo à instagram, tinder, ou tipo post-it. Não importa! São apenas suportes. O que interessa é o conteúdo produzido. Isso é o que precisa ser entendido por todos: a capacidade criativa NÃO É DADA PELA FERRAMENTA usada mas sim por quem a alimenta, ou seja, TODOS NÓS!

Dou um exemplo super simples: o que faz uma pipa voar? Como se constrói uma?

A partir desta pergunta simples são acionados conhecimentos de física, matemática, artes, educação física, para ficar apenas em alguns casos. Os alunos podem tentar explicar a relação entre os tipos de papel, peso, volume, velocidade do vento no equilíbrio de sua manutenção no ar. Ao mesmo tempo que para sua construção e decoração precisam de elementos criativos e habilidade manuais. Empinar a pipa significa um bom esforço e condições ideais de clima e espaço físico (aqui se aborda o risco de uma descarga elétrica por raios ou rede elétrica). Notaram quantos elementos podem ser colocados, construídos e desconstruídos a partir daí? E há mais: as pipas podem conter para sua ilustração pequenos trechos ou poesias…

Videos criados pelos alunos podem mostrar o passo-a-passo. Ou quem sabe alguém consiga desenhar estas etapas utilizando-se da noção de elaboração de um infográfico.

Enfim… o céu é o limite para criar.

Mas aqui retomo o papel dos professores: o medo do improviso e flexibilização por parte de alguns se dá por sentirem que estão sem suas armas de segurança. O espaço da sala de aula e do livro didático se torna seu grande porto seguro. Ao criarmos situações inusitadas de aprendizagem encontraremos experiências talvez muito diferentes do que imaginamos inicialmente. Este é o ponto e a inação de muitos. Ao despertar nos alunos esta fagulha de criatividade e caminho interdisciplinar é preciso estar aberto a tudo.

E por último, mas não menos importante. Não se fie em ferramentas. Fie-se na produção conjunta de conhecimento. Escolha uma ferramenta que sirva aos teus interesses e necessidades e não o contrário, uma ferramenta que te faça de servo e te obrigue a se adequar a ela.

Descobrirá rapidamente que o segredo não é a digitalização em si, mas sim na forma como produz conhecimento a partir dos caminhos que trilha e como se aprende a aprender.

Boa sorte!!!

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