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A Cultura Digital e seus Excluídos

Por: Eliana Rezende Bethancourt

É preciso que se diga e se assuma definitivamente: a Cultura Digital é restrita a poucos, e estes só possuem lugar garantido no consumo de países desenvolvidos.

Uma massa gigantesca da humanidade permanecerá onde está: excluída!

O desenvolvimento tecnológico não propicia de forma alguma a possibilidade de distribuição igualitária de bens tecnológicos. Já que bens tecnológicos significam poder de compra.

Mas a cultura tecnológica tem também suas carências. As redes sociais que brotaram nesta fauna apresentam muitos e variados problemas e dentre eles talvez seu maior defeito: criadas e desenvolvidas para um ambiente de consumo caracterizam-se por pouca ou quase nula atenção. Tem seus movimentos em ondas de massas, mas que infelizmente não significam autoconhecimento.

Alguns dirão que são revolucionárias. Não as considero como tais! Conseguem sim, em alguns casos, arregimentar pessoas em torno de pautas muito pontuais. Não adiantaria pautas extensas ou longas. Não conseguiriam adeptos. E por isso a afirmação de que as redes sociais não tem consistência atenta.

“A tecnologia se perpetua através da desatenção, desigualdade, inconsistência e consumo ávido. Sem tais ingredientes não se mantém”. 

Por: Eliana Rezende Bethancourt

A exclusão digital também se configura pela forma como indivíduos se apropriam desta tecnologias, e isto pode significar ter ou não ter determinado aplicativo ou aparelho. Mas também pode significar única e exclusivamente saber utilizar a parafernália que os acompanha ou até não conseguir acesso à redes WiFi. 

O que é ponto pacífico em um ou outro caso é que a exclusão digital anda pare-passo com a exclusão social. São simbióticas e pertencem a indivíduos que antes de tudo, estão em uma determinada camada da sociedade. A exclusão digital é portanto, um dos produtos de que a exclusão social é capaz de fazer. 
Podemos considerar que o acesso à internet estendida a todos os cidadãos figura como uma categoria de Direitos Humanos que deve ser oferecida a todos indistintamente.

Por exemplo, no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos é assegurado a todos os seres humanos o direito à informação. O texto segue como encontrado:

“Artigo 19: Todos os seres humanos têm direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.”

Declaração Universal dos Direitos Humanos, ONU

Mas o acesso a informação por si só não oferece a igualdade de condições entre as diversas pessoas e nem mesmo a apropriação desta para a produção de Conhecimento. É neste sentido que a Economia de Conhecimento enfrenta muitos desafios, em especial o que lida com a exclusão digital, que se transforma numa grande barreira para que o salto qualitativo de fato se dê na sociedade como um todo. Tal fato se dá porque a produção de Conhecimento necessita de fatores intrínsecos e extrínsecos ao próprio indivíduo para que se realize. Dar acesso por si só não é garantia de quase nada. A informação propiciada por meios tecnológicos necessita ser apropriada e transformada em experiência prática pelo próprio individuo que deverá ser incluído tanto por ferramentas como por saber identificar como elas podem ser usadas.

A pior parte de uma forma de exclusão como a que temos em nosso país é ela ocorrer em pleno momento da história que se diz que vivemos no tempo da sociedade de informação. Mesmo esta expressão intelectualmente construída para caracterizar um tempo de explosão informacional e de recursos tecnológico esbarra nos abismos sociais e culturais que diferentes partes do mundo possuem. E ao que tudo indica, como sempre ocorreu na história, estes bens não terão ampla distribuição e acesso à todas as parcelas da sociedade.   

E ainda temos outro ingrediente fundamental: não basta apenas haver meios disponíveis em termos nacionais de tecnologia se as pessoas não souberem como utilizar as diferentes ferramentas para otimizar sua vida e seus trabalhos, e com isso ser capaz de produzir conhecimentos ou melhores condições na elaboração de suas atividades cotidianas e de trabalho. Sem entender esta lógica, dificilmente haverá benefícios gerais.

Donde se conclui que a exclusão digital pode ocorrer de diferentes maneiras:

  1. A primeira e a mais visível é o individuo não ter o acesso à computadores, internet ou outros meios digitais que favoreçam o acesso e a troca de informações.
  2. Analfabetismo digital e às vezes, também funcional, onde o indivíduo simplesmente não compreende o básico necessário para ler e usar comandos tecnológicos simples sem auxílio de uma outra pessoa
  3. Incapacidade de saber usar ferramentas básicas de todos os dias que o auxiliariam em tornar o desenvolvimento de suas atividades cotidianas.
  4. Puro e simples desinteresse. Onde o individuo não sabe e não se interessa em aprender.

O que é certo é que a exclusão econômica leva à exclusão digital quase que de forma espontânea. A exclusão digital é quase o produto final de uma exclusão econômica que em geral, se atrela à uma exclusão social.

Por isso, é fundamental entender que não basta apenas haver internet, redes ou equipamentos. Se não enfrentarmos a exclusão social e econômica, a exclusão digital NUNCA será eliminada ou minorada. Por isso, precisamos entender que políticas públicas NECESSITAM ser implementadas e pensadas tomando-se em conta esta realidade no nosso país e o caminho primeiro é via da Educação.

Afinal, se fazemos mais, melhor e mais rápido com o uso e apropriação de tecnologias por que ainda há abismos entre nós?

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Os Analfabetismos do Século XXI

Por: Eliana Rezende Bethancourt

De uma sociedade que chegou a ser chamada de sociedade de informação temos nos convertido num exército de analfabetos surgidos do modo de viver digitalmente neste principio do século XXI. 

O volume avassalador de informações produzidos e reproduzidos em rede tem mostrado o quanto quantidade tem sido inversamente proporcional à qualidade.
O desenho propiciado por plataformas e aplicativos digitais favorecem que as informações fragmentadas possam circular em grande quantidade e fazer um rastro imenso em diferentes camadas da população. Este estilhaçamento faz com que a mesma informação alcance nichos diversos com capacidades diversas de lidar com tais fragmentos.

Ou seja, apesar da possibilidade de maior velocidade de compartilhamento tais registros não primam por reflexão e aprofundamento. É um plainar raso sobre todo e qualquer tema. Com um outro agravante: em segundos e um clique todos se convertem em especialistas de TODOS os assuntos e temas, em vários casos, com perspectivas e defesas tão apaixonadas que podem gerar muito barulho e furor.

É óbvio que as redes surgiram para interação entre pessoas, e tinham como principal objetivo agilizar assuntos sem aprofundá-los. Era algo muito interessante inicialmente. O que ocorreu a seguir foi começar a se converter na única forma de comunicação em diferentes ambientes. De rodas de conversas entre amigos e familiares, sua adoção foi por outros setores e rapidamente foi tragada por ambientes institucionais e até educacionais. 

Tudo isso somado: superficialidade + agilidade resultou em uma gama imensa ou de publicidades de todas as ordens, em especial as indesejáveis, e de outro muuuita desinformação. O pulo para desinformação foi favorecido exatamente por esta incapacidade de ler e ter crítica sobre o que se lê. Atentem que a palavra crítica aqui possui aquele sentido de ser capaz de aprofundar um tema ou assunto por que a pessoa se deteve e estudou para aquilo, a boa crítica deveria se assentar em argumentos e bons fundamentos.
Mas não é o que temos.

O fundo deste problema é uma geração inteira que nasce e cresce num ambiente onde as redes sociais dominam e a elaboração de um pensamento crítico e aprofundado é cada vez mais abandonado. 
No geral, e propiciado por tais comunicações rápidas das redes, os mais jovens mostram uma quase incapacidade de concentração, análise e reflexão sobre um determinado tema. 

“A atenção fragilizada e dispersa somada a incapacidade de pensamento reflexivo nos leva diretamente  aos mais novos analfabetos do século XXI. O analfabetismo aqui tem rastros e vícios digitais. Muitos não conseguem se quer escrever com letra cursiva ou escrever corretamente sem um corretor ortográfico acionado. Pensamentos mais complexos e correlacionados quase ficam inviabilizados e o exército destes analfabetos aumentam dia a dia  e são facilmente mensurados no número de desempregados ou sem profissões. Muitos não conseguem reunir o mínimo necessário para se capacitar e desenvolver um pensamento mais abstrato e robusto”. 

Por: Eliana Rezende Bethancourt

Não confundir esta forma de analfabetismo, que é a incapacidade de formular raciocínios mais complexos e profundos em direção ao pensamento mais reflexivo e critico com o que denominamos analfabetismo digital.

Neste caso, o analfabetismo digital se refere à ausência de acesso aos meios digitais. São pessoas que mesmo alfabetizadas no sistema tradicional não conseguem usar e se valer das diferentes tecnologias digitais. Possuem dificuldade em utilizações básicas de editores de textos, planilhas, visualização ou produção de documentos em meios digitais.  

O analfabetismo digital está intimamente relacionado à pobreza.
A tecnologia não é um sistema igualitário e sua manutenção e atualização exige recursos. Quem não os possui será automaticamente alijado de todo o sistema.
Neste sentido, o analfabetismo digital é mais uma face da desigualdade social, cultural e econômica que aflige milhões na humanidade. 

Convivendo com tais formas de analfabetismo temos o mais popular de todos e que precede os que abordamos até aqui que é o analfabetismo funcional.

O analfabetismo funcional vem se transformando num clássico entre diferentes níveis de escolaridade, pois atinge de forma irrestrita uma grande gama de todas a população supostamente escolarizada.

O analfabetismo funcional pode se manifestar de diversas formas, mas as mais usuais são os casos em que o individuo de fato aprendeu a ler e tecnicamente aprendeu a fazer uma leitura pragmática envolvendo seu dia-a-dia, mas que não é capaz de interpretar um texto ou compreender subtextos. O analfabeto funcional possui seu diploma, mas é incapaz de ter um raciocínio bem elaborado ou fundamentado sobre um tema, não é capaz de construir argumentações ou fundamentações valendo-se de seu aprendizado.

Por isso, é usual encontrarmos analfabetos funcionais em níveis considerados superiores, onde a pessoas passam por processos de alfabetização, consegue ingressar em cursos que não exigem tanto em seus processos seletivos, e por isso, serão incapazes de exercer suas profissões porque simplesmente não conseguem ir além da mera leitura.
Não constroem ou elaboram a partir do que aprendem, e por isso, também não são capazes de emitir posicionamentos ou pesquisas circunstanciadas sobre o que quer que seja.

Vê-se que quando temos estas sobreposições de analfabetismos estaremos diante de um grande problema não apenas escolar mas sociocultural.

É preciso compreendermos as diferentes camadas de que são feitos tais analfabetismos, para que em todos os casos seja devolvido a estes atores a possibilidade de ter pleno acesso e cidadania social, cultural e digital. Sem compreender isso, estaremos mergulhados num pântano de preconceitos nebulosos e total incapacidade de viabilizar informação para a produção de conhecimento.

De tudo o que foi mencionado, fica claro que todos aqueles que se dedicam aos temas acima e suas conexões com a Educação terão obrigatoriamente de tomar em conta os caminhos de desigualdade social que atinge nossa população de forma avassaladora.
A partir da pandemia de Covid19 todos estes elementos se entrecruzaram e revelaram um país com muitas dificuldades e obstáculos a vencer. Foi escancarado o que já institivamente sabíamos: os fossos educacionais se estreitavam cada vez mais quanto mais carentes eram os públicos.

Milhões de alunos ficaram completamente reféns de uma situação que mostrava aos quatro cantos que seus pais e outros membros de sua família sofriam de vários níveis de analfabetismo e que pouco ou nada poderiam ajudá-los em suas dúvidas.

E não foi difícil encontrar educadores que também sentiam em maior ou menor grau seus limites em relação à alfabetização digital.

Assim, fica absolutamente claro que se não cuidarmos de nossas desigualdades todas as outras camadas de dificuldades apenas se aprofundarão e irão compor uma verdadeira erosão social e cultural em nosso país em pouquíssimo tempo. A digitalização do mundo está sendo responsável, ao mesmo tempo em que oferece novas profissões e caminhos de subsistência, um grande exército de desocupados que simplesmente não conseguem assimilar este novo mundo.

O laço estreito entre analfabetismo digital e exclusão digital ocorre na medida em que parte considerável da população é alijada dos meios possíveis para gerar riqueza e conhecimento a partir destes meios digitais. Isso ficou muito patente durante a pandemia de Covid19 quando milhões de pessoas não tinham como realizar seus trabalhos remotamente, ou crianças que não tinham como ter suas aulas online.

Mas a exclusão digital possui outros tentáculos e por consequência outros alcances:
– é uma importante barreira a ser vencida para os que desejam produzir saber e conhecimento;
– acentua diferenças sociais
– dificulta acesso ao trabalho e por consequência melhoria nas condições de vida e renda;
– acentua o isolamento e a distância de territórios e pessoas (quanto mais distantes e pobres os territórios de exclusão digital aumentam)

Esta exclusão digital não possui um único tipo. Ela pode ser subdividida em:

  • exclusão de acesso
  • exclusão de uso
  • exclusão de qualidade no acesso

    O que este itens significam? Eventualmente as pessoas simplesmente não conseguem ter acesso ao meio digitais. Outros até podem possuir o acesso, mas não dominam de forma eficaz tais meios. E finalmente, há aqueles que possuem o acesso, conseguem usar algumas de suas possibilidade e ferramentas, mas não possuem conhecimento diversificado e aprofundado para tirar o máximo proveito de todos os recursos que estariam disponíveis.

    Ou seja, a exclusão digital é tão complexa quanto a exclusão social, mas possui uma série de variáveis que interferem em todo o processo e estes estão totalmente ligados aos meios digitais.

“Especificamente no caso do Brasil, a exclusão digital se assenta nas desigualdades sociais, culturais, econômicas e históricas.
Daí sua complexidade e acabar se transformando em reflexo de todas elas”.
E o principal: a exclusão digital e a exclusão social se retroalimentam reforçando uma à outra.

Por: eliana Rezende Bethancourt

Não enfrentar isso, significará ter um país cada vez mais empobrecido, famélico e sem possibilidades de exercer atividades que lhe ofereceram uma remuneração que mantenha a si e sua família.

É disso que teremos que tratar como cidadãos que ensinam e lutam por igualdade e cidadania digital e social .

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